São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2010

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#PRONTOFALEI

LULI RADFAHRER - folha@luli.com.br

O messias que não virá

NA INDÚSTRIA de tecnologia é comum a figura corporativa do messias inovador, que emerge das trevas com uma solução mágica. Por causa do iPad, Steve Jobs está na moda de novo, pentacampeão que já trouxe o micro, o Mac, a Pixar e o iPhone. Profissionais como ele dominam a atenção em uma sociedade controlada pelos desejos de consumo.
Por mais que se valorizem os progressos da ciência, quase ninguém sabe de nomes eméritos em qualquer área que não seja a de aparelhinhos eletrônicos e serviços digitais. Enquanto todos se concentram no produto final, a infraestrutura é deixada de lado. Cabos e planilhas não têm charme. Saúde e educação, muito menos.
Uma boa prova está em Bill Gates, que se aposentou e foi tratar de malária. Há quanto tempo você não ouve falar dele? Sua fundação salva mais vidas do que qualquer celebridade que adote bebês, mas não é tão chique quanto os aviões que a Virgin pretende colocar na rota da Lua.
O acesso às tecnologias eletrônicas pessoais deixa um rastro bem visível de lixo eletrônico e de gargalos de infraestrutura.
A África é um bom exemplo: quem vê uma foto noturna do planeta talvez não repare que boa parte do continente é, efetivamente, negra. Por desinformação ou preconceito, pode ser que acredite que seja assim porque lá só tem selva. Dificilmente pensará que isso acontece por falta de distribuição regular de energia.
Sem eletricidade estável, computadores queimam e não há luz para aulas ou hospitais à noite. Saúde e educação continuada se tornam precárias e as diferenças sociais só aumentam.
A infraestrutura de energia é um problema cada vez mais sério. É preciso investir na busca de formas alternativas de coleta e distribuição antes que cheguemos ao ponto em que, mesmo com Belo Monte, o sistema não dê mais conta. Um bom caminho poderia ser a criação de uma rede inteligente, que cobre pelo consumo como a telefonia o faz: por hora e tipo de uso.
Inclusão digital já foi fator de riqueza, hoje é de educação. Logo será de estrutura. É preciso preparar o país para a rede e resolver os problemas de desigualdade enquanto são administráveis. Hoje quase todos têm computadores. É o que se faz com eles que importa.
O messias não virá, mas pode ser criado aqui.


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