São Paulo, quarta-feira, 06 de abril de 2011

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LULI RADFAHRER

Uma crise de meia-idade


Mudar dá trabalho e provoca dores de cabeça, principalmente para quem já está consolidado


Vários profissionais bem-su-cedidos, quando perto da meia idade, encontram uma situação inédita.
Depois de galgarem todos os postos disponíveis em suas carreiras e verem os filhos bem encaminhados deixarem a casa, sua vida deveria seguir para um patamar em que poucas mudanças acontecem. Pois é nessa hora que o cenário muda e revela ameaças até então desconhecidas: a casa de repente parece grande demais, a carreira já não se mostra tão definida, as decisões ficam cada vez mais complexas e até mesmo seu papel social já não é mais tão evidente. Pela frente, o vazio apavora. Mesmo que, naquela condição financeira, o problema não seja tão grande.
As empresas e a mídia enfrentam uma situação parecida. Consolidadas em um mercado que mudou pouco durante quase todo o século passado, seu horizonte parecia sereno. Nem mesmo a globalização, a enorme variedade de produtos da concorrência e a força do marketing pareciam ameaçar a liderança das marcas de sempre, apoiadas na mídia de sempre e reforçada pela boa e velha publicidade.
De repente, tudo mudou. Internet, mídias sociais, tablets, netbooks, e-readers e smartphones transformaram a relação das empresas com seus públicos de uma forma sem precedentes.
Não é exagero dizer que a mídia mudou mais nos últimos 20 anos do que nos 200 que os precederam, por mais que rádio e TV sejam grandes invenções.
Nesse mar turbulento, grandes empresas são transatlânticos, em pânico para não terem o mesmo destino do Titanic ou do Exxon Valdez. Boa parte até gostaria de mudar, mas não faz ideia de como virar um barco daquele tamanho.
Seu problema não é falta de informação ou dinheiro, mas de agilidade. Boa parte se tornou tão grande que não sabe por onde começar a mudar. Por isso suas estratégias digitais são inseguras, com medo de perder o patrimônio ou se fazerem de ridículas enquanto posam de espertas.
Elas estão cada vez mais parecidas com os executivos de meia-idade que, sentados nos sofás de suas salas agora grandes demais, pensam até em mudar para um apartamento menor, mas depois recuam. Mudar dá trabalho, custa dinheiro, traz dores de cabeça, implica trocas de grupos sociais, questiona o status. É mais confortável tomar mais uma taça de Bourgogne e deixar a decisão para o dia seguinte. Ou para quando for inevitável.
Empresas e mídia mudam pouco porque são poucos os que realmente querem que elas mudem.
Por mais que o futuro seja desejável, o passado é mais confortável. Como todos já estiveram nele, suas regras são conhecidas e não demandam novos aprendizados que, em muitos aspectos, só aumentam as inseguranças. Olhando para trás, é fácil identificar quais tecnologias dariam certo e por quê. Para a frente, tudo o que se tem são especulações.
E assim se avança para o futuro com o freio de mão puxado, carregando excesso de bagagem, repetindo erros por tradição, preguiça ou teimosia.
Como crianças que fecham os olhos e se imaginam invisíveis, muitas empresas se fazem de desentendidas e continuam onde estão até que uma crise force a mudança. Para só daí perceber que ela deveria ter acontecido há um bom tempo.

folha@luli.com.br


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