|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ENTREVISTA TOM BISSELL
Heróis de games precisam ganhar mais substância
Autor de livro que discute a narrativa nos jogos eletrônicos diz que é importante dar aos personagens dos jogos sentimentos e coisas inteligentes para dizer
FERNANDA EZABELLA
DE LOS ANGELES
Desde os tempos de Mario
Bros, a indústria de videogames batalha para dar realismo a seus personagens. A
boina vermelha de Mario,
por exemplo, servia para esconder a dificuldade de recriar cabelos, um desafio que
existe até hoje. Para alguns
especialistas, porém, não é o
cabelo o problema dos games. É a falta de coração.
"Os desenvolvedores trabalham duro para fazer penteados maravilhosos, mas esquecem o quanto é importante dar a esses personagens
sentimentos e coisas inteligentes para dizer", disse à
Folha o americano Tom Bissell, autor do livro "Extra Lives Why Video Games Matter" (Vidas extras, por que videogames interessam), lançado no mês passado nos Estados Unidos.
Inquietações do tipo movem as entrevistas e reportagens que Bissell fez com nomes importantes da indústria do videogame, uma das
mais lucrativas do mundo e
que movimentou US$ 20 bilhões em 2009.
O autor, premiado por livros de ficção, como um sobre a guerra do Vietnã, insiste que os games são sim uma
forma de arte, embora ainda
precisem ir além das narrativas tradicionais e melhorar
muito os diálogos capengas
de seus jogos. Tal crítica acabou resultando num convite
para ele mesmo escrever o roteiro de um jogo, mas Bissell
não pode dar detalhes.
O autor mergulhou no universo dos games ao encontrar dificuldades para terminar um trabalho, ainda inacabado. Passou 200 horas
decifrando o mundo de Oblivion e meses cheirando cocaína e jogando Grand Theft
Auto IV, experiências que ele
narra em detalhes no livro
"Extra Lives".
Além dos depoimentos
pessoais, ele também descreve passagens de jogos como
se fossem verdadeiras tramas literárias.
"As emoções que eu senti
nesses momentos -medo,
dúvida, coragem- foram tão
intensas como eu nunca antes senti, seja lendo um livro,
vendo um filme ou ouvindo
uma música", escreveu, após
descrever uma batalha contra zumbis em Left 4 Dead.
Leia a seguir trechos da entrevista.
FOLHA - Como surgiu a ideia
do livro? A impressão é que
você se sentia muito culpado
por perder tanto tempo jogando e se divertindo.
Tom Bissell - Isso certamente sim [...] Mas eu queria
desesperadamente ler algo
engraçado e crítico sobre a
experiência de jogar videogame. E quase todos os escritos sobre games caem em três
categorias: posts de blogs,
que podem ser bem engraçados, mas geralmente curtos;
resenhas de games, que só
dizem sobre o que é o jogo; e
teorias acadêmicas. Então eu
me organizei para escrever o
livro que eu gostaria de ler.
Você e outros designers se
preocupam com os diálogos,
narrativas, emoções. Mas a
indústria ainda pena para fazer o cabelo dos personagens.
Pode uma coisa ser mais importante que a outra?
Não me importo com gráficos, cabelo e todas essas coisas se o game tiver imaginação, consistência e estilo.
Como jogar videogame influenciou sua literatura?
Provavelmente não ajudou em nada, na verdade. Jogar videogame usa uma parte da sua mente completamente diferente de quando
você lê um livro. De fato,
quando eu jogo muito videogame, tenho que treinar minha mente para se concentrar em livros de novo, o que
às vezes leva alguns dias.
Quais foram os principais desafios para fazer o livro?
O maior foi tentar explicar
o que é tão atraente na experiência de jogar videogame.
Eu nunca tinha escrito esse
tipo de coisa. Mas já revisei
muitos livros e percebi que
escrever sobre um jogo é como tentar descrever o que
acontece em um romance.
Ficou preocupado em como
as pessoas reagiriam ao fato
de você ter usado cocaína?
Sim, muito. Mas achei que
era uma experiência importante, algo novo sobre a experiência de jogar videogame. Mas muitos ficaram chocados. Minha mãe chorou.
Texto Anterior: Atalho - José Antonio Ramalho: Saiba criar slides de imagens impressas Próximo Texto: Conheça Tom Bissell Índice
|