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Turismo

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J. P. Cuenca

O robalo dos campeões em Lima

A esse restaurante no Peru, ninguém vai pelo décor, tatuagens do cozinheiro ou adrenalina na hora da conta

Na quadra 8 da avenida Angamos, no popular distrito limenho de Surquillo, uma porta dupla dá espaço a um balcão com seis lugares. Por trás dele, a cozinha aberta de Tomás Matsufuji ocupa a maior parte do El Toke Pez. Na contramão das casas comandadas por chefs-celebridade do centro gastronômico mais ascendente do planeta, o simplório restaurante não parece muito preocupado com sua imagem.

Ninguém virá aqui pelo décor, tatuagens do cozinheiro, charme dos convivas e descarga de adrenalina em conseguir uma reserva --ou na hora de pagar a conta. El Toke Pez é sobre comida, que comemos em talheres de plástico e pratos de isopor.

Na hora do almoço em finais de semana, uma grande fila ocupa a calçada. Se você acorda de ressaca e almoça tarde como eu, a coisa fica menos complicada a partir das 14h30 --só não chegue muito mais tarde que isso, o peixe acaba logo.

Há gente de todo tipo: empregados do comércio local que chegam com tupperwares vazias, senhoras do bairro e turistas bem informados.

Todos comemos em silêncio apenas interrompido para falar da comida. Se em outros restaurantes, os comensais peruanos parecem sofrer de uma espécie de deficit de atenção do paladar --é comum começar a discutir outros pratos enquanto come-se o que está à frente, num desfile de experiências sobre as aparentemente infinitas variações da culinária peruana--, aqui só temos atenção para o agora.

O ápice da minha última excursão peruana foi o cachete de pescado frito do El Toke Pez, um robalo empanado flutuando num molho que equilibra tempero picante e acidez com delicadeza entre pimentões, tomates e brócolis. Parece simples, é simples e ao mesmo tempo não é: é sublime.

Minutos antes, vimos Matsufuji refogá-lo no fogão com gestos de um mestre que parece praticar um tipo raro de tai chi chuan na sua pequena cozinha. Tudo é fresco, feito na hora e sai das suas mãos: ceviches, arrozes, saltados, chicharrones, mariscos, leche de tigre. Isso aqui é o céu e o céu nunca foi tão barato. Os pratos custam entre 10 e 20 soles novos (de R$ 7 a R$ 14).

Tomás Matsufuji tem pouco mais de 30 anos, é filho de japoneses e tem doutorado em química supramolecular em Surrey, na Inglaterra. Aprendeu a cortar e cozinhar peixes com o pai, Dario Matsufuji, figura legendária da cozinha peruana-japonesa.

Desde 2011, El Toke Pez é um sucesso algo maior que seus seis lugares, mas nada disso até agora fez o chef pensar em ampliar o negócio, virar uma estrela midiática, abrir franquias ou aceitar a ajuda de um investidor, caminho natural para as estrelas da sua geração. O motivo é simples. O samurai de Surquillo não tem tempo: "Todos os dias, acordo de madrugada pensando no peixe que vou comprar no mercado".

Talvez seja o contato direto de um chef com a própria comida o que faça seu peixe superior aos que provei em restaurantes do Gastón Acurio, hoje o homem mais influente do país, ou mesmo no badalado La Picanteria, um paraíso de comida norteña da costa do Peru que tem a melhor casa de sardinhas que já comi na vida. Superior, claro, no sentido de comparar divino com excelente.

Voltar ao Brasil depois de alguns dias em Lima é sentir que está perdendo uma importante dimensão da experiência humana. No Peru, se come. Aqui, nós tentamos.

El Toke Pez abre de segunda a sábado, das 11h30 às 16h. Av Angamos Este, 886, Surquillo, Lima, Peru.


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