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O local mais isolado do mundo

Descoberta há 290 anos, população da ilha de Páscoa foi escravizada, enfrentou doenças e escassez de recursos

Pedro Carrilho/Folhapress
Moais do ahu (plataforma) Tongariki, na costa sul da Ilha de Páscoa
Moais do ahu (plataforma) Tongariki, na costa sul da Ilha de Páscoa

DO ENVIADO À ILHA DE PÁSCOA

Como é costume em comunidades isoladas, os rapanuis são orgulhosos de sua herança cultural e um tanto desconfiados de forasteiros. Têm, ao menos na superfície, um jeito ríspido que pode ser confundido com antipatia ou rudeza. Nada que os melífluos termos iorana korua ("olá" e "tchau") ou maururu ("obrigado") não consigam derreter. Mas é necessário ter conhecimento da história para compreender o que se passou (e se passa) por ali.

A história de Rapa Nui, desde o declínio do culto aos ancestrais, é uma sequência de eventos trágicos impostos por jogos colonialistas e também autoimpostos, que puseram em risco a existência da própria comunidade.

HISTÓRIA TRÁGICA

Muito da história da ilha de Páscoa se perdeu ao longo dos séculos. O que se sabe do período anterior à vinda dos europeus, além de todos os sítios arqueológicos, vem em grande parte da tradição oral.

Não há registros arqueológicos anteriores ao século 8 d.C, quando o rei Hotu Matu'a teria atracado na praia de Anakena vindo das Ilhas Marquesas, Gambier, Cook ou Pitcairn em canoas duplas.

Depois de navegar por semanas ou meses pelo Pacífico, os colonizadores polinésios encontraram aqui um paraíso tropical de frondosas palmeiras e recursos aparentemente ilimitados.

A sociedade floresceu e passou a se dedicar à construção dos moais e ao culto dos ancestrais. Os recursos, claro, provaram-se limitados e a obsessão com os moais fez com que as florestas fossem devastadas.

O processo de construção e transporte das estátuas, além da superpopulação, teve impacto definitivo no frágil ecossistema, gerando súbita escassez de recursos. Foi o estopim de um longo período de guerras entre clãs, que começou no fim do século 17 e durou cerca de cem anos. Nesse período, a população recorreu ao canibalismo.

Quando os primeiros europeus (holandeses) chegaram, no domingo de Páscoa de 1722, estima-se que a população estava reduzida a 20% de um total de 15 mil pessoas que viveram na ilha no seu auge, um século antes. Além dos holandeses, espanhóis e britânicos também fizeram relatos nas décadas seguintes.

Os capítulos trágicos da história de Rapa Nui ainda estavam por vir. Em 1862, navios escravagistas peruanos tomaram a ilha e sequestraram metade dos rapanuis, incluindo os líderes e homens fortes, para trabalharem como escravos nas reservas de guano das ilhas Chinchas, na costa do Peru.

Ao serem libertados e retornarem a Rapa Nui, os poucos sobreviventes levaram consigo as doenças do continente, que quase dizimaram o restante da população.

Vulneráveis, os rapanuis foram presas fáceis para os missionários, que chegaram logo depois e rapidamente trataram de reprimir as práticas religiosas locais. Eles destruíram, dentre muitos objetos, as tábuas Rongo-Rongo, que continham a linguagem escrita local, nunca decifrada.

Anos depois, os missionários foram expulsos por um oficial da marinha da França, junto com quase todos os habitantes locais, que foram obrigados a trabalhar em ilhas da Polinésia Francesa.

Os franceses transformaram Rapa Nui num grande rancho para a criação de ovelhas entre 1870 e 1877. A ilha atingiu, então, o número mais baixo de sua população.

Quando Rapa Nui foi anexada oficialmente pelo Chile, em 1888, a concessão da ilha foi vendida para a companhia britânica Williamson-Balfour, que novamente fez dela fazenda de criação de ovelhas para comércio de lã.

Os ingleses tinham o controle efetivo da ilha, e permaneceram lá por mais de 50 anos. Nesse período, os rapanuis sofreram novo revés: a vila de Hanga Roa foi cercada e transformada num gueto de onde os locais só podiam sair com permissão.

A concessão não foi renovada pelo governo do Chile quando expirou em 1953, e a Ilha de Páscoa passou então para as mãos dos militares chilenos. Até hoje a população rapanui controla poucas coisas fora dos limites de Hanga Roa.

A década de 1960 trouxe os norte-americanos, que usaram a ilha como base no oceano Pacífico, e deixaram como legado a pista do aeroporto Mataveri.

Em 1967, Rapa Nui finalmente era conectada ao resto do mundo como escala num voo comercial que ligava o Chile a Papeete, no Taiti. Em 1984, a pista foi ampliada pela Nasa para eventuais pousos de emergência de ônibus espaciais.

(PEDRO CARRILHO)

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