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"TUPI OR NOT TUPI?"
Náufrago alemão inspira rota no litoral
Escultura de Hans Staden, nascido no séc. 16, homenageia o autor de um dos primeiros registros do país
Eduardo Knapp 28.dez.2004/Folha Imagem
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Vista do canal de Bertiga, palco das aventuras de Hans Staden há mais de 450 anos e contadas em livro escrito por ele mesmo, que é considerado um dos primeiros documentos do nosso litoral
MARINA DELLA VALLE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Uma terra que se estende por
centenas de milhas, coberta
por uma vegetação exuberante,
lar de selvagens de pele marrom-avermelhada que falam
línguas estranhas, divididos em
várias tribos, quase sempre inimigas entre si. Uma terra de índios canibais, cuja culinária inclui mingau de vísceras humanas, petisco reservado às mulheres e às crianças durante os
rituais antropofágicos.
Esse foi o Brasil encontrado
em meados do século 16 pelo
jovem aventureiro alemão
Hans Staden, durante as duas
viagens que fez ao país. Na segunda delas, foi contratado pelos portugueses para defender
Bertioga e ocupar o forte ali
construído. Acabou sendo capturado pelos tupinambás, tribo
que dominava um território
que ia desde a região de Ubatuba, a 226 km de São Paulo, até o
Rio de Janeiro.
Staden passou nove meses
entre os tupinambás, escapando por pouco de virar churrasco -seus captores eram inimigos dos tupiniquins e, por extensão, dos portugueses, que
mantinham relações de colaboração com a tribo rival. E o costume entre os brasileiros, naquela época, era devorar os inimigos aprisionados.
Após escapar do cativeiro,
viajou para sua Alemanha natal, onde publicou, em 1557, o
relato de suas aventuras. O livro, que tornou-se um sucesso
na Europa, só foi traduzido no
Brasil em 1892, ganhando várias edições posteriores, e pode
ter influenciado o movimento
antropofágico do modernismo.
O sucesso literário, porém, não
encontra paralelo no turismo.
"Não consigo entender como
não tem uma agência brasileira, ou alemã, ou uma conexão
brasileira-alemã que leve as
pessoas para refazer as viagens
de Staden", diz o escritor e historiador Eduardo Bueno (leia
mais na pág, F5), autor do prefácio da última edição do livro
do aventureiro alemão, "Duas
Viagens ao Brasil", lançado
neste ano (tradução de Angel
Bojadsen. L&PM. 181 págs.).
Em suas viagens, Staden passou por vários pontos da costa
brasileira, como Pernambuco e
Santa Catarina. Mas foi no eixo
Rio-São Paulo que se passou o
ponto mais crítico da experiência do alemão no Brasil, sua
captura e os nove meses que
passou em cativeiro entre os
tupinambás.
Um dos poucos locais que
preservam a memória de Staden é o forte de são João, em
Bertioga (a 103 km de São Paulo). No parque que cerca o forte,
foi inaugurada uma escultura
do alemão no último dia 20. Do
outro lado do canal de Bertioga,
já no Guarujá, restam apenas
ruínas do forte de são Felipe,
cujo primeiro artilheiro foi Staden.
Segundo especialistas consultados pela Folha, não é possível especificar onde ficava a
aldeia de Ubatuba onde Staden
passou a maior parte de seu
tempo como cativo. A área dos
tupinambás era extensa, e os
vestígios são escassos.
Nem por isso a Ubatuba do
litoral paulista deixa de prestar
homenagem ao aventureiro e
sua história: há uma rua que leva seu nome, além da rua Cunhambebe. A cidade foi cenário
para o filme "Hans Staden", de
1999, dirigido por Luiz Alberto
Pereira.
Em São Paulo, a exposição
"Entre as Gentes Antropófagas", com 19 painéis que reproduzem a trajetória do alemão
no Brasil, fica em cartaz até a
próxima quarta-feira.
Nas próximas páginas, conheça lugares por onde Staden
passou no litoral paulista e locais que preservam um pouco
da natureza e da fauna que o
alemão encontrou na costa
brasileira no século 16.
"ENTRE AS GENTES ANTROPÓFAGAS"
Até 7 de maio. Biblioteca Florestan Fernandes, FFLCH. Av. Prof. Lineu Prestes,
travessa 12, 350, Cidade Universitária.
Tel. 0/xx/11/3744-1070. De seg. a sex.,
das 9h às 22h, e sáb., das 9h às 13h. Entrada gratuita
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