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TERRA DE LAGOAS
"Capitão Mouro" revela que muçulmano esteve em Palmares
O que livro tem, escola não ensinou
DA ENVIADA ESPECIAL A ALAGOAS
A mesma coincidência que
trouxe o muçulmano Saifudin à
capitania de Pernambuco, no século 17, trouxe às mãos do jornalista Georges Bourdoukan, 58,
muitos anos depois, um manuscrito que atestava a existência de
um mouro no quilombo dos Palmares (as terras ficam hoje a cerca
de uma hora de Maceió, de carro).
Até então, a façanha de resistir aos
ataques do bandeirante genocida
Domingos Jorge Velho era mérito
quase que exclusivo de Zumbi.
E, se o reconhecimento à figura
do líder dos Palmares ainda é proporcionalmente pequeno -em
Alagoas mesmo são poucas as
pessoas que conhecem de fato sua
história e valor-, sabe-se menos
ainda da importância que o mouro teve nos anos finais desse um
século de resistência de Palmares.
Depois de passar os olhos no tal
manuscrito -uma carta do então
governador da capitania de Pernambuco dizendo que um certo
mouro construíra fortificações
para o quilombo- e de nada encontrar nos arquivos oficiais e bibliotecas, Bourdoukan constatou
que, para a história do Brasil, até
então Saifudin não existia.
Das pesquisas em Andaluzia,
Marrocos, Argélia, Tunísia e Líbia, obteve um bom material que,
adicionado principalmente aos
relatos de beduínos e berberes,
deu origem ao "Capitão Mouro".
Nasceram então personagens
como o senhor de engenho Epaminondas Conde e seu escravo e
amante Gaspar, Maria Paim, a
mulher branca de Zumbi, além da
interessante e um tanto quanto
cômica figura do merdeiro, cuja
obrigação era recolher as fezes do
seu senhor e dormir sob sua cama
(para o caso de eventualidades).
Para que sua pesquisa não virasse mais um livro histórico e
"esquecido nas prateleiras",
Bourdoukan mesclou seus registros acumulados a diálogos fictícios que criou. Deu em literatura.
Ler "A Incrível e Fascinante
História do Capitão Mouro" é como ouvir uma daquelas histórias
que se conhece desde criança,
mas entendendo o real significado dos fatos. O que era tratado como lenda, mito, revela-se em histórias fundamentadas. Explica-se
o mal-de-bicho, o significado da
letra F e da cruz gravadas em brasa nos corpos dos escravos, a falta
de higiene dos brancos na cidade.
Quem vai hoje à cidade de
União dos Palmares, do alto da
serra da Barriga, pode reconstruir
visualmente as situações narradas, com a mesma visão panorâmica que Zumbi tinha daquela
nação de oprimidos. Mesmo sem
a imensa floresta de palmeiras,
hoje destruída, mesmo com as
terras pertencendo aos "bandeirantes", isso ainda é possível.
Essas e outras histórias, a partir
de agora, como diria Bourdoukan, "a história registra".
(CF)
A INCRÍVEL E FASCINANTE HISTÓRIA
DO CAPITÃO MOURO - De: Georges
Bourdoukan. Editora: Sol & Chuva.
Quanto: R$ 25 (216 págs.)
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