São Paulo, segunda-feira, 05 de agosto de 2002

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Falta só cheiro de sangue e suor em área do sítio arqueológico de terracota que ainda passa por escavações

Soldados de barro, 2.200, virão de Xian a SP

NA CHINA

Os brasileiros terão o gostinho de ver pela primeira vez no país 11 cavaleiros de terracota da dinastia Qin, em tamanho natural, que serão expostos na maior mostra sobre cultura chinesa realizada no Brasil, com abertura no dia 29 de outubro na Oca, em São Paulo.
É uma pitada do que se vê em Xian. Cabeças separadas dos torsos, pedaços de corpos humanos misturados aos de cavalos, lanças despontando do chão empoeirado: trata-se de uma enorme praça de guerra, congelada no tempo após uma batalha dramática.
É essa a impressão que se tem ao percorrer as extensas escavações do Exército de Terracota de Xian, um dos principais sítios arqueológicos da China, situado a 28 km da capital da Província de Shaanxi.
Formado por cerca de 8.000 guerreiros, devidamente paramentados com armaduras, elmos, escudos e armas e acompanhados de grande número de cavalos e de carros de guerra, o exército foi idealizado por Qin Shi Huang (221 a.C.-210 a.C.), que há cerca de 2.200 anos unificou os diversos povos em conflito e fundou a dinastia Qin, tornando-se o primeiro imperador da China.
Para guardar sua tumba, que até hoje permanece inviolada no interior de uma colina artificial de dezenas de metros de altura, ele mandou modelar um exército de terracota em tamanho natural, cujos integrantes distinguem-se por roupas e acessórios, segundo suas funções e hierarquia e pelas expressões dos rostos.
Os integrantes da impressionante força armada foram dispostos em três áreas a algumas centenas de metros do túmulo do imperador.
Os fossos foram divididos, em intervalos regulares, por grossas paredes de barro e, em cada nicho, os guerreiros, os cavalos e toda a parafernália bélica foram cuidadosamente enfileirados, em formação de batalha.
Em seguida, o conjunto foi protegido por um teto feito de madeiras nobres e coberto de terra, permanecendo oculto e esquecido durante mais de 2.000 anos.
Apenas em 1974 o exército foi redescoberto por camponeses que perfuravam um poço. Desde então, iniciou-se um complexo trabalho de pesquisa, que está longe de terminar, o que dá ao visitante a oportunidade única de presenciar o processo de escavação de um dos mais importantes sítios arqueológicos do mundo.
Sobre os três fossos foram erguidos três grandes galpões com passarelas, de onde se pode ver as estátuas de barro de cima. Ao entrar no primeiro -e maior- galpão, o visitante depara-se imediatamente com a visão mais conhecida do Exército de Terracota de Xian: cerca de mil guerreiros de barro em pé e enfileirados, armados e prontos para a batalha.
Essa foi provavelmente a imagem idealizada por Qin Shi Huang para desencorajar eventuais violadores de sua tumba. Mas ela teve de ser recriada pelos arqueólogos a partir dos pedaços de estátuas resgatados no período das escavações. Nos séculos que permaneceu sob a terra, o exército foi duramente vitimado pela ação do tempo, por elementos naturais, vandalismo e roubo.
Partes das coberturas de madeira ruíram, destruindo e soterrando as estátuas que estavam embaixo. Hoje, o que se vê nas áreas que estão sendo escavadas lembra um campo de guerra, repleto de braços, pernas, cabeças e torsos humanos e de animais, misturados a diversos artefatos bélicos.
Tudo parece saltar das entranhas da terra, já que partes do exército permanecem enterradas enquanto outras emergem do chão empoeirado. É uma visão aterradora e, ao mesmo tempo, poética. Por um lado, há uma forte dose de realismo, parece haver cheiro de sangue e suor no ar.
Por outro, são só restos de estátuas de barro, embora feitas por mãos humanas 2.200 anos atrás.
Conhecer o Exército de Terracota de Xian é, sem dúvida, uma experiência grandiosa, uma mistura de história e ficção.
É como a representação, em grande escala, de uma cena da "Ilíada". Ou melhor, de um correspondente chinês ao épico de Homero. (OTÁVIO DIAS)


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