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LETÔNIA, LITUÂNIA, ESTÔNIA
Aos 66, filha de estonianos foi ao país que conhecia de histórias
Invasões soviéticas e falta de emprego permeiam a memória de estonianos, letões e lituanos no Brasil
PRISCILA PASTRE-ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL
Eles viajaram mais de 15 mil
quilômetros para se conhecer.
Estonianos, os pais de Erna
Liddik Koosberg, 77, se viram
pela primeira vez no Brasil. Em
três meses estavam casados.
Ele, que morava em Omsk, na
Rússia, e ela, que vivia em Tartu, na Estônia, saíram da Europa pelo mesmo motivo: falta de
emprego. "Eles nunca deixaram de amar a Estônia, mas diziam que a terra deles era o Brasil, onde vieram em busca de
oportunidades -e as encontraram", conta.
Dona Erna conheceu a terra
dos pais aos 66 anos. "Acho impressionante o fato de a capital
ser metade medieval e metade
moderna. Fui duas vezes. E
gostaria de voltar mais vezes."
Na infância, ela imaginava o
lugar através das histórias contadas pela mãe. A que mais ouvia é sobre a origem do lago
Linda Järv, em Tallinn, perto
do porto. Segundo um conto
popular, o "lago da Linda", como a mãe o chamava, surgiu de
um coração partido. "Foi quando uma moça, abandonada por
seu amor, chorou de saudade
por tanto, mas por tanto tempo, que acabou dando origem a
um lago", reproduz.
Como os pais nunca deixaram de conversar em estoniano, e a mãe praticamente só
preparava os pratos de seu país,
dona Erna fala e lê fluentemente o idioma e, na cozinha, capricha nas receitas estonianas.
"Lá as pessoas comem muita
batata, peixe e carne de porco,
já que a carne bovina não é tão
comum", diz. Há poucos pastos
no país por causa do frio -no
inverno, chega a fazer 30C negativos. "Fica muito caro manter o gado no estábulo, que precisa ser aquecido com tubos de
água subterrâneos para os animais não morrerem de frio."
Uma especialidade de dona
Erna é o chouriço, embutido de
sangue de porco, cevada, cebola
e temperos, que ela prepara no
Natal. "Encho as tripas e levo
ao forno. Uma delícia comer
com bacon e geléia de ameixa."
Para recordar a infância, faz a
lurka, uma sopa doce. "Misturo
uva, damasco, maçã e pêra. Cozinho até que engrosse, como
uma compota. Depois, é só adoçar, esperar esfriar e comer."
Nascida em São Paulo, um
dos passatempos preferidos de
dona Erna na infância era ver
os pais se enrolarem no português. "Uma vez, na feira, meu
pai pediu arroz ao vendedor. O
moço colocou um bom tanto, e
meu pai dizia: "mais, mais!". O
rapaz continuou colocando arroz. O problema é que, em estoniano, pronuncia-se "mais" para
"milho". Ele queria milho, mas
acabou levando foi um bocado
de arroz, mesmo", diverte-se.
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