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FERNANDO GABEIRA
Novo turismo para o planeta em mutação
Turim - De novo na Europa
para uma conferência sobre
mudanças climáticas, constato
que ao menos as empresas aéreas
mudaram. E muito. Já não nos
brindam mais com aqueles conjuntos que tinham creme dental,
escova, pente, bálsamo de lábio,
graxa de sapato, escova de roupa
e venda para os olhos.
Agora não se dá mais nada, e o
vinho também não é mais aquele.
Dá para sentir que está havendo
uma grande transformação depois do 11 de setembro. Ninguém
sabe para onde nos levará, mas a
revista "Newsweek" da semana
passada acredita que tenha localizado o viajante do futuro e fez
disso sua capa. As pessoas estão
viajando mais em seus próprios
países e escapando de multidões,
buscando os lugares mais remotos e seguros. É uma ilusão pensar
que os lugares inseguros não têm
vez. Há agências trabalhando, exclusivamente, com o turismo político, levando jovens para onde as
coisas acontecem, como a Palestina, ou para onde aconteceram
num passado próximo, como
Chiapas (México).
O Brasil acaba de lançar um
plano de turismo, mas temo que
essas novas linhas dinâmicas não
estejam sendo discutidas como
mereciam. Tudo muda muito rápido e seria preciso também muita rapidez para interpretar e explorar os câmbios. Primeiro, foi o
11 de setembro; depois, a guerra
no Iraque e, finalmente, a Sars.
A França continua liderando a
lista dos países que recebem mais
turistas, com 75 milhões de visitantes. É quase 20 vezes mais visitada que o Brasil. A Espanha está
bem situada em segundo lugar,
na frente dos EUA, da Italia e da
China. Não quero entrar na discussão que parece a do ovo e da
galinha, mas sinto que, neste momento, já não se trata mais de investir apenas. É preciso investir
com uma análise precisa do potencial, sabendo exatamente que
público se quer atingir.
Tanto no Brasil como na Europa, pelo menos na França e na
Alemanha, discute-se muito a
previdência social. Divulga-se a
tese de que o sistema de repartição vai mal e que o pacto entre as
gerações pode explodir no futuro.
Sugere-se a entrada do regime
de capitalização, através do qual
a pessoa pode gerir seu futuro, pagando o que gostaria para receber
o que supõe precisar até o fim de
sua vida. Desde que seu fundo de
pensão não quebre também, como aconteceu com muitos.
A sensação que todo esse debate
da previdência comunica, no auge de uma crise mundial, é que
precisamos tomar muito cuidado
com o futuro, pois nos enganamos
com a ilusão de que ficaríamos
cada vez mais ricos. O clima psicológico na esquerda européia é
de apreensão com a crise: a experiência histórica mostra que uma
de suas consequências é a tentativa de anular conquistas sociais.
Acontece que na Alemanha a
própria esquerda é que terá de
achar o caminho de uma reforma
responsável. Longe de mim dramatizar o momento. As pessoas
continuarão consumindo e continuarão viajando.
É provável, no entanto, que mudem seus hábitos, que reflitam
um pouco mais. O Brasil continua aspirando a ser um centro turístico mundial. Além disso, continua jogando suas fichas no aumento da exportação para abater
dívidas e manter a economia em
movimento. Precisamos aprender
com as empresas japonesas de exportação, que alavancaram o
país em momentos difíceis. Elas
sempre investiram na informação e na análise. Tanto investiram no passado que começaram
a gostar da atividade, hoje uma
das mais lucrativas. Ganham dinheiro não apenas vendendo e
comprando mercadorias materiais. Seu ramo ascendente de lucro são os dados e os conselhos de
quem se informa mundialmente.
No Brasil, o presidente Lula disse que queria instalar um mascate em cada embaixada. Expressou com isso o desejo de ampliar
nossa presença no mercado global. Seria importante que essa rede de vendedores com que o presidente sonha se materializasse
também numa rede de analistas
que nos indicassem possíveis caminhos. Claro que isso hoje já é
feito por uma competente diplomacia. Mas os japoneses dessas
grandes empresas investiram dinheiro e montaram uma estrutura pesada, com satélites, equipes
nos EUA e nos países da Ásia.
A capacidade de antecipação de
nossos cientistas e diplomatas colocou bem o Brasil no debate planetário sobre as mudanças climáticas. Isso nos capacita a aspirar
aos investimentos em desenvolvimento sustentável que os países
ricos terão de fazer para reduzir
suas emissões de dióxido de carbono. Esse encontro das possibilidades abertas por uma análise
adequada das tendências mundiais com os empresários brasileiros é que pode abrir algumas clareiras -como a mistura de álcool
com gasolina nos países que precisam reduzir a emissão de poluentes. Assim como ajudou a formular a proposta, o Brasil pode
ajudar a resolver esse problema.
Talvez esteja exagerando um
pouco, coisa de fusos horários,
mas a frase de Guimarães Rosa
exprime tudo o que disse: "Sapo
não pula por boniteza e sim por
precisão". Comprei um livrinho
aqui em Turim e o autor, Luciano
Gallino, fez questão de enunciar
uma longa frase na capa: "Políticos e empresários sem visão de futuro transformaram a Itália numa colônia industrial. Para recuperar o terreno, é preciso uma política com alta intensidade de trabalho e de conhecimento". Tentarei aprender com os italianos.
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