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CAPITAL GAÚCHA
"Grande dama do jazz" reúne plateia no porão de casa
Ivone Pacheco fundou o Take Five há 27 anos e faz sessões musicais semanais dela com outros jazzistas
DA REDAÇÃO
Ivone Pacheco não toca sozinha. Aos 77 anos, decidiu que
daqui em diante só abrirá o piano quando tiver gente para ouvir. "Preciso de plateia", diz.
Mas Ivone não se refere a uma
plateia de milhares de pessoas
no palco de um teatro famoso.
"Eu abro as portas da minha casa e toco no porão", conta.
Conhecida em Porto Alegre
como "a grande dama do jazz"
ela fundou, há 27 anos, o Take
Five. Uma vez por semana, durante anos, o portão só encostado era a senha para quem quisesse entrar para ouvir a sessão
musical encabeçada por ela.
Bastava entrar, como quem
passa para visitar um amigo,
para ser agraciado com a música de Ivone e outros jazzistas.
Em entrevista à Folha, ela
conta como nasceu o Take Five
-cujos encontros, apesar de
menos frequentes, ainda acontecem- e como foi tocar nas
ruas de Paris e Nova Orleans.
FOLHA - Como surgiu o clube de
jazz Take Five?
IVONE PACHECO - Estava andando de bicicleta na praia de Tramandaí quando ouvi, de longe,
uma música. Segui o som e cheguei ao piano que ficava à disposição dos alunos da universidade do Rio Grande do Sul.
Quem sabia, chegava e tocava.
Eu não era aluna, mas me sentei e toquei. O pessoal gostou do
meu estilo. Um menino chegou
perto e disse que eu era jazzista.
Ele perguntou: "Em que bar a
senhora toca?". Eu não tocava
em lugar nenhum. Tinha quase
50 anos, era casada, já tinha
três filhos. Não era bonito uma
mulher desacompanhada ir para o bar à noite. Na época, meu
marido cuidava da fazenda da
família e eu me sentia muito sozinha. Então decidi que toda semana receberia outros músicos
para sessões de improvisação.
A gente deixava o portão aberto
e o pessoal ia chegando. Um
amigo ia avisando o outro e, em
pouco tempo, já tinha fila na
porta de casa. Tocávamos das
21h até as 3h, 4h, 5h...
FOLHA - Ainda há sessões?
PACHECO - Sim, mas com menos
frequência. No mês passado, fizemos uma especial, de aniversário. No período das festas juninas estamos programando
outra. Contando com essa, até o
final do ano devem acontecer
mais umas duas. Mas dá trabalho, sabe? Tem de limpar antes
e depois, fazer salgadinhos para
receber as pessoas. E eu não ando mais tão bem de saúde. Agora, quando acontece, procuramos restringir mais aos amigos
ligados à música.
FOLHA - Como aprendeu a tocar?
PACHECO - Eu tinha quatro anos
quando me sentei no piano do
hotel onde morava [o pai era
dono de um hotel] pela primeira vez. Aos oito comecei aulas
com uma professora particular.
Mas aos 18 abandonei o piano.
Tinha de arrumar meu baú com
enxoval e me casar. Aí vieram
três filhos na sequência. Não
deu para continuar. Minha mãe
morreu... Retomei anos depois.
FOLHA - E como foi voltar?
PACHECO - Pedi para uma das
minhas filhas me levar pra Nova Orleans. Eu queria tocar lá,
no berço do jazz. Queria tocar
na rua, ver a reação das pessoas
que eram pegas de surpresa pela minha música. E fiz isso. Em
Nova Orleans e em Paris. Em
Nova York e em Nova Jersey
toquei em vagão de trem. Acordeon, gaita francesa...
FOLHA - A senhora já viu seus vídeos na internet?
PACHECO - Minhas filhas já me
mostraram. Quem não teve a
chance de me ver no porão,
agora pode me ver no YouTube.
(PRISCILA PASTRE-ROSSI)
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