São Paulo, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

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"JÁ QUE TÁ, QUE FIQUE"

Não é fácil achar uma pamonha em Piracicaba

A busca pelo puro creme do milho faz que o doce propagandeado em Kombis ganhe ares de lenda urbana

DA ENVIADA ESPECIAL A PIRACICABA

Quem tem mais de 30 anos e cresceu no Sudeste tende a imaginar que todas as pamonhas vêm de Piracicaba, por força do jingle repetido à exaustão pelas caixas de som dos vendedores ambulantes.
Procurar pelo doce in loco, no entanto, deixa a sensação de estar caçando uma lenda urbana. Ninguém sabe bem onde comprar uma pamonha. É possível encontrar o petisco em ambulantes na rua do Porto e no Mercado Municipal -nada de uma fábrica de pamonhas capaz de suprir um exército de Kombis e Brasílias país afora, como se poderia imaginar.
O fato é que Piracicaba já teve uma fábrica familiar de pamonhas que chegou a produzir 5.000 unidades por dia e originou o famoso jingle, gravado nos anos 1960. O anúncio do "puro creme do milho" pegou, foi utilizado por vendedores de pamonhas de outras procedências e sobreviveu à fábrica, que fechou na década de 1980.
A antiga fábrica de pamonhas, que ficava na rua do Porto, nasceu do trabalho das irmãs Wasty, Jenny e Noemi Rodrigues, que, nos anos 1950, resolveram engordar o orçamento familiar fazendo o doce para vender. O trabalho começava à tarde, quando o milho era retirado dos sabugos e moído, e adentrava a madrugada, quando era preparado e cozido.
"Pamonha é uma coisa que estraga. Elas precisavam estar prontas quando os vendedores chegavam, às 5h30", lembra Davi Ferreira Barros, 65, reitor aposentado da Unimep e filho de Jenny. Ele ajudava a família e chegou a vender pamonhas antes de se tornar estudante universitário.
No auge da demanda, a produção chegou a envolver 15 pessoas, introduzindo uma novidade no mercado: a palha do milho era costurada antes de receber o doce, o que agilizou o trabalho. "Com o tempo eles foram mecanizando a coisa", conta Barros. A fábrica funcionou até os anos 1980. "As famílias foram crescendo, almejando outras coisas", diz.
Barros pôde reviver um pouco da história de sua família ao conhecer Wanda e Ademir Assarisse, da vizinha Charqueada, no programa "Comida Boa", da TV Unimep, capitaneado por José Luiz Mazzi, chef e professor de química da instituição.
Assim como fizeram os Rodrigues há cerca de 50 anos, os Assarisse resolveram botar a mão no milho e construíram, há um ano, a cozinha industrial para fazer curau e pamonha.
Há 15 anos, quando fez a primeira porção de pamonhas, Wanda, 53, nunca havia provado o doce. Hoje ela chega a produzir 3.000 unidades por semana, com a ajuda de sete ou oito pessoas. A palha, seguindo a tradição das irmãs Rodrigues, é costurada. O horário de trabalho também é semelhante: da 1h às 5h50, quando os vendedores vêm buscar a mercadoria. "O produto precisa sair fresquinho", diz Ademir, 55.
E, assim como as pamonhas das irmãs Rodrigues, o doce feito pelos Assarisse não leva leite na receita. "Pamonha paulista não tem leite", explica Wanda. O casal faz o doce por encomenda, mas quem quiser arriscar pode encontrar algumas unidades prontas, a R$ 1,70. É preciso combinar a visita pelo tel.: 0/xx/19/3486-1506;
Quem faz questão de se fartar de pamonha em Piracicaba pode programar a visita para os finais de semana de 7 e 8/3, 14 e 15/3 ou 21 e 22/3, quando ocorre a Festa do Milho no distrito de Tanquinho. Ali é garantida a fartura de pamonhas e de outros produtos à base de milho.
O centro rural de Tanquinho foi alvo de um projeto para industrializar a produção de pamonhas e de outros produtos de milho, parceria que envolveu a Esalq, a Fapesp, o Sebrae e a Prefeitura de Piracicaba. Além de identificar as implementações necessárias para a produção em condições ideais de higiene e qualidade, o projeto visou o estímulo da plantação de milho na região, dominada por canaviais. Concluído em novembro passado, está pronto para ser implementado.
"O produto deve ser congelado à vácuo e mantido sob refrigeração, e não vendido em isopores, como é costume", diz Gilma Lucazechi Sturion, professora do departamento de agroindústria, alimentos e nutrição da Esalq e coordenadora do projeto. "Buscamos resgatar a tradição da pamonha na cidade. Há a discussão sobre o nome, se vai ser pamonha de Piracicaba. Mas parece que já tem registrado no Paraná...". A lenda, pelo visto, continua. (MARINA DELLA VALLE)


5.000
unidades de pamonhas fresquinhas eram produzidas diariamente na fábrica familiar dos Rodrigues

1960
foi a década em que o jingle foi gravado

3.000
pamonhas é a produção semanal dos Assarisse, que fazem o doce há 15 anos; hoje, a fábrica deles funciona em Charqueada, município vizinho a Piracicaba

R$ 1,70
é o preço de uma pamonha


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