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ENTRE "CERROS"
Ingressos a preços módicos popularizam a música em bares; nova geração é aficionada por bossa nova
Jazz ao vivo impõe o ritmo nas noites da capital chilena
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, NO CHILE
"Uno, dos, tres." E as mãos começam a dedilhar o piano, num
ritmo que já faz os pés dos ouvintes irem para cima e para baixo.
Segundos depois entra o saxofone
-a boca do instrumentista se enche e se esvazia, os olhos fecham
nos momentos de som mais agudo. Sem tirar as mãos do teclado,
o pianista olha para trás e vê, por
seus óculos de metal grandes e
quadrados, o seu alvo na mesa do
lado do palco. "Jorge!", grita, sem
parar de tocar. O homem da mesa
olha para ele, olha para frente, dá
de ombros. O som continua. O
contrabaixista acaba de afinar seu
instrumento, sobe ao palco e começa a tocar. Jorge se apressa, levanta, toma as baquetas e conduz
a bateria. O jazz de Santiago faz o
corpo todo balançar.
É o show de Cultrera, Spinoza e
Cia., que se apresenta todas as terças e sextas em El Mesón Nerudiano, umas das casas de jazz da
capital chilena. O ritmo começa a
pipocar aqui e ali na cidade: Santiago parece querer tomar forma
de uma Nova Orleans latina. Nos
palcos, se encontram desde os
mais tradicionais músicos do país
a jovens faces que estréiam no cenário da noite. Música boa, sempre executada ao vivo. Para ouvir,
basta pagar módicas entradas (a
mais cara delas custa 4.000 pesos
chilenos; R$ 17). Mas, com uma
taça de vinho chileno, fica melhor.
O Méson (Domínica, 35, www.elmesonnerudiano.cl) é um restaurante-bar que tem arte no cardápio. Em seu subsolo de paredes
de pedra, pode-se jantar assistindo a peças de teatro, ouvindo declamações de poesia do padrinho
da casa, Neruda, ou, claro, escutando jazz. Há shows todas as noites (exceto domingo e às vezes
quarta), e a entrada custa, em geral, 2.000 pesos chilenos (cerca de
R$ 8; varia com o show). Nesse caso, a taça de vinho sugerida acima
deve acompanhar um dos bons
pratos do menu, inspirado nos
gostos gastronômicos do poeta
-o suave pastel de jaiba (um
crustáceo) é o carro-chefe.
Giovanni Cultrera comanda o
piano, enquanto Alfredo Espinoza é o mestre do sax e do clarinete.
Duas lendas vivas do jazz do Chile
-nascidos em 1931 e 1942, respectivamente. São os dois únicos
músicos profissionais no grupo.
A americana Danielle Gilson, que
faz as vezes de diva, arranca sorrisos com muitas caras e bocas.
Nelson Arriagada no contrabaixo
e Jorge Rodriguez Donoso na bateria completam o quinteto.
No mesmo bairro, o Bellavista,
o pequenino El Perseguidor (Antónia Lopez de Mello, 0126;
www.elperseguidor.cl) é abrigo
para um público mais jovem, tanto nas mesas quanto no palco.
Aos brasileiros, é familiar ouvir as
canções da nova geração de jazzistas de Santiago. Eles veneram
nossa bossa nova. E dá-lhe "Garota de Ipanema", "Samba de Uma
Nota Só" e "A Felicidade", cantadas por moças nervosas, em um
português de generoso sotaque,
mas com afinação e insistência.
Não é raro ver mesas com famílias
inteiras aplaudindo entusiasticamente seus rebentos cantores. Os
shows ocorrem de quarta a sábado, a partir das 22h30. A entrada
custa 1.500 pesos chilenos.
Ainda nas redondezas boêmias
da Bellavista, o Thelonious (Bombero Nuñez, 336; www.thelonius.cl) tem visual mais claro e moderno, abusando da madeira no projeto arquitetônico. Estantes oferecem livros, para uma leitura antes
de o show começar. O palco, rebaixado, não fica um dia sequer
sem receber músicos (o ingresso
custa no máximo 2.000 pesos chilenos). No dia da visita da Folha, o
pianista Gonzalo Palma, importante nome em Valparaíso, abusava freneticamente de seu instrumento, acompanhado por músicos jovens no baixo e na bateria.
O Club de Jazz de Santiago é a
maior das casas. Escuro, está em
um casarão antigo no bairro de
Nuñoa (José Pedro Alessandri, 85;
www.clubdejazz.cl) -o que contrasta com a berrante estampa das
toalhas que cobrem as mesas.
Tem espectadores de todas as idades, que vêm ouvir jazzistas de todas as idades. Há shows de sexta a
domingo, às 22h. A entrada custa
3.000 pesos chilenos (R$ 12,47).
No sábado, quando três artistas se
apresentam, sobe para 4.000 pesos chilenos; estudantes pagam
2.500 pesos chilenos. Entre, acomode-se, peça seu vinho e faça
um brinde ao jazz chileno.
(JULIANA DORETTO)
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