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FERNANDO GABEIRA
Adivinhem o que vão fazer nesse verão
"A taques terroristas surgem de surpresa. As guerras costumam se anunciar com
uma sucessão de ultimatos e manobras diplomáticas. Essa história do ataque norte-americano
ao Iraque, com direito a debate
no Conselho de Segurança da
ONU, vai afetar a todos, mas alguns países, como o Brasil, mantêm-se discretos.
O primeiro impacto da guerra
no turismo talvez seja psicológico:
medo de atentados terroristas pode prender as pessoas em casa.
Mas o segundo impacto, de grandes repercussões, seria o possível
aumento do preço do petróleo,
que chegou a US$ 29 por barril,
apenas com a ameaça de George
W. Bush.
O Brasil já disse na ONU que as
ações armadas devem ter respaldo internacional. Mas é tímido no
planejamento nacional para o caso de uma guerra.
Nosso presidente, que chama os
candidatos à sucessão para discutirem o acordo com o FMI, não se
anima a chamá-los para falar do
Iraque e suas consequências no
interior de nossas fronteiras.
Você pode objetar que minha
crítica seja voluntarista. Afinal,
que peso tem um país do porte do
Brasil para deter a marcha insensata da história? Se Nelson Mandela pensasse assim na sua África
do Sul, não teria se movimentado
tanto, escrito cartas para Bush,
concedido entrevistas coletivas,
enfim, batalhado por uma solução pacífica e diplomática para o
conflito.
Se os alemães, que também não
dispõem de armas nucleares, se
calassem, talvez Saddam Hussein
não se sentisse encorajado a apresentar uma saída, abrindo o país
para os inspetores internacionais.
A possível guerra no Iraque tornou-se um tema central na campanha alemã, que se encerrou ontem. Social-democratas e Verdes
jogaram tudo na paz. Podem até
ter perdido as eleições, mas, nesse
aspecto particular, souberam interpretar melhor que o adversário
o sentimento dos alemães.
Embora seja um leitor atento de
jornais, não consigo detectar na
campanha brasileira nenhum
vestígio de preocupação com a
proximidade da guerra.
A única menção de que me recordo foi a do caricaturista Chico
Caruso, mostrando os candidatos
brasileiros com a mão na cabeça
diante de um Bush prestes a detonar sua bomba.
Fernando Henrique pode imaginar que esteja inventando trabalho para o governo. Há gente
que resume sua crítica na expressão mágica: falta de vontade política. Superestimar sua própria capacidade em política internacional é mais desastroso do que no
campo doméstico.
No entanto uma reunião dos
países latino-americanos e do Caribe para conversar sobre a proximidade da guerra, no meu entender, não seria nenhum exagero.
Muitas coisas vão se mexer se as
primeiras bombas explodirem no
solo iraquiano. Essa mexida tende a, de uma certa forma, reduzir
as exportações e impor mais aversão ao risco entre os investidores
internacionais.
Valia a pena, pelo menos, dizer
ao FMI: "Tudo bem, concordarmos em produzir um superávit de
3,75%, concordamos em conter a
inflação etc, mas tudo isso dentro
de uma determinada conjuntura
mundial". A mudança brusca da
conjuntura, teoricamente, deveria levar a uma flexibilização do
acordo.
Sem contar também com o fato
de que os eleitores brasileiros
gostariam muito de ouvir o que
os eleitores de outras partes do
mundo ouvem. O Oriente Médio
precisa de paz ou de mais uma
guerra?
Sem entrar no mérito de cada
uma dessas posições, defendo
apenas que o Brasil precisa aceitar um pouco mais a existência
do mundo, não apenas como cinematográfico planeta azul, mas
como uma condição de nossa
própria existência.
Há um certo desconforto para
uma iniciativa brasileira, uma
vez que, segundo denúncias de
um cientista iraquiano, o urânio
do Iraque foi importado do Brasil. Nosso país exportou urânio,
mas o Iraque não detém a tecnologia para enriquecê-lo. Além
disso, todo o urânio exportado
pelo Brasil, segundo nossas autoridades, está sob custódia internacional.
A exportação do urânio aconteceu num passado que estava
fora de nosso controle. Por que
não esclarecer amplamente à
mídia internacional, sobretudo à
inglesa, que divulgou o assunto?
Exportar matérias-primas ou
mesmo armamento para aquela
região é o tipo de desconforto pelo qual quase todos os grandes
países passaram.
Ninguém tem condições reais
de atirar a primeira pedra. É
possível conviver com esse desconforto e propor uma saída negociada, como os alemães, por
exemplo.
Bush está ameaçando algo para as férias de verão. Pelo menos
os turistas não podem ficar indiferentes a essa realidade e precisam planejar seu futuro próximo, levando em conta, mais uma
vez, a presença da guerra.
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