São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 2005

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Ruínas das Missões reúnem e "catequizam" turistas

DA ENVIADA ESPECIAL

A ruína da "reducción", ou redução, de Santíssima Trinidad del Paraná, patrimônio histórico da Unesco, a 400 km de Assunção, é um exemplo de como eram os povoados jesuítas, onde índios eram reunidos e catequizados. Também o turista é "catequizado", ou seja, introduzido ao conhecimento da história das ruínas.
O termo redução é usado para se referir a um conjunto de prédios formado por casas para índios, casas para sacerdotes, igreja, escola e praça maior.
Evita-se usar o termo missão para designar esses lugares. Missão era o conjunto de idéias que movia os integrantes dessa ordem -e não o local geográfico.
A redução de Trinidad foi uma das últimas a serem criadas. Ela foi fundada em 1706 pelo padre Juan de Anaya.
Tudo ali foi feito de pedra. Ao chegar, depara-se com a praça maior circundada pelas construções que abrigavam os indígenas tendo, ao fundo, a igreja. Estima-se que ali vivessem 5.000 índios, submetidos a um horário rígido ditado pelo dobrar do sino.
Ao percorrer a praça maior rumo à igreja, dá para imaginar como era o cotidiano. Os índios trabalhavam em suas terras durante quatro dias. Essa produção era destinada à subsistência da família. Por dois dias, trabalhava-se a terra comum. O fruto desse cultivo era para alimentar órfãos, viúvas e inválidos. Sobrava um dia na semana, usado para o descanso. A igreja é o ponto alto do passeio. Mesmo em ruínas, guarda detalhes importantes.
Eles surgem logo na entrada, onde fica a única imagem identificável que sobrou: a de são Paulo. Há outras figuras, mas lhes faltam partes. Havia um santo em cada pilar de sustentação da igreja.
No lugar onde eram velados os corpos dos mortos, há um entalhe enorme e curioso na parede: uma representação do inferno. O tempo apagou as imagens do painel, mas as chamas ardentes da morada dos maus permanecem lá.
A pia batismal está inteira. O púlpito também se apresenta íntegro, mas apenas ficou assim depois de uma restauração que colou, como peças de um quebra-cabeça, os 1.500 pedaços que foram encontrados.
Ao lado do altar, entalhes na pedra mostram anjos tocando instrumentos musicais, inclusive uma harpa paraguaia. Durante as missas, os meninos guaranis formavam um coro.
Quase zonzo de olhar para essas ruínas carregadas de informação, o visitante, que a essa altura estará suando em bicas sob o sol, pode subir por uma escada de pedra até um ponto alto na igreja. Dali, terá uma visão panorâmica -e inesquecível- do sítio, além de ganhar uma leve brisa no rosto.
Para evitar o calor excessivo, vale chegar às 17h. O local fecha às 19h. Em duas horas, dá tempo de ver tudo e de contemplar as ruínas do alto, sem ter de encarar o bravo sol paraguaio a pino.
Ali perto fica San Ygnacio, onde foi, por oposição, fundada a primeira redução jesuíta do Paraguai, em 1609. Com a expulsão dos jesuítas, em 1767, não tardou muito para que as reduções fossem abandonadas. Foi o que aconteceu com a missão de San Ygnacio. Os prédios foram desmoronando com o tempo.
Então, nessa cidade, foi decretado que a igreja deveria ser destruída, pois ameaçava desabar. Os moradores pegaram as imagens que estavam lá, talhadas em madeira, e as guardaram em casa.
Elas foram protegidas pelos locais até que o governo anunciou que iria criar um museu dedicado à missão. As estátuas foram devolvidas em relativo bom estado.
Entre elas, estão três peças bem curiosas, que ficam logo na primeira sala do museu. São três anjos: um branco, um negro e um índio. Essas obras, no entanto, não foram declaradas patrimônio histórico pela Unesco, pois foram muito alteradas.
(HL)


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