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Onda andina em SP
Kantuta é pedacinho dos Andes em São Paulo
TRADIÇÃO - Feira vende produtos processados como nos tempos dos incas
MAURÍCIO MORAES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Em 2002, o espaço empoeirado na confluência das ruas
das Olarias e Pedro Vicente, no
bairro paulistano do Pari, ganhou uma plantinha diferente,
a kantuta, um dos símbolos dos
Andes. Cuidadosamente trazida do frio altiplano, a flor delicada não resistiu ao calor.
Plantada para celebrar a praça a que deu nome, a muda viajou por três dias no bagageiro
de um ônibus, junto de batatas,
pimentas e vários tipos de milho, vendidos aos domingos na
feira de produtos andinos.
Essa mesma variedade de cores e sabores começa a aterrissar no país por outras vias, com
a abertura de sofisticados restaurantes de comida peruana.
A julgar pelo sabor refinado de
pratos como o ceviche (peixe
cru marinado com limão e servido com batata-doce) e pelo
sucesso da cozinha peruana
mundo afora, já se antevê que
essa já se firma como a nova
moda gastronômica.
A muda de kantuta veio na
bagagem de Esperanza Quispe,
61. Boliviana de La Paz, ela chegou a São Paulo há 23 anos, com
as três filhas, para trabalhar como costureira. Em 2002, ajudou a fundar a feira Kantuta,
que rebatizou uma praça do Pari e se transformou no principal
ponto de encontro da numerosa comunidade boliviana.
Por muitos anos, Esperanza
repetiu a viagem de três dias até
Cochabamba, para buscar os
produtos que vende numa das
70 barracas da feira. A grande
variedade de tipos de milho e
batata é possível devido à diversidade de ecossistemas que
mudam à medida que aumenta
a altitude da cordilheira.
Os produtos são cheios de
história. O cultivo e o processamento dos alimentos é, muitas
vezes, similar ao usado pelos
incas antes da conquista europeia, no século 16.
A "tunta" é um bom exemplo.
De cor branca, parece uma pedra. Trata-se, no entanto, de
uma batata. Congelada pelo
frio inverno do altiplano, a batata é colhida e deixada dentro
de um saco em água corrente
por um mês. Depois, é deixada
ao relento para novamente ser
congelada e desidratar.
O processo milenar garante
um prazo maior de validade.
Depois de rehidratada, a tunta
é usada no chicharrón, feito
com carne de porco, e em outros pratos andinos.
Embora a feira Kantuta seja
visitada sobretudo por bolivianos, os produtos são em boa
parte os mesmos que fazem a
fama da cozinha peruana.
Caso do aji, condimento feito
a partir de uma espécie de pimenta. Seja nas barracas simples da feira ou em restaurantes peruanos, o aji de gallina está sempre no menu.
Movido pelo paladar ou por
curiosidade antropológica, o
passeio à praça Kantuta aos domingos é no mínimo interessante. Além das salteñas, empanadas e pães típicos é possível ver ainda um partida de futebol e eventualmente uma
apresentação folclórica.
Descontadas as diferenças de
latitude e altitude, a Kantuta é
um pedacinho dos Andes em
São Paulo.
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