São Paulo, quinta-feira, 27 de maio de 2010

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JOSÉ AVILLEZ

Fiz uma ruptura total com passado do restaurante

EM APENAS DOIS ANOS, CHEF REFORMULA O TAVARES E CASA GANHA A SUA PRIMEIRA ESTRELA

ENVIADA A PORTUGAL

Um dos chefs mais novos de Portugal à frente do restaurante mais antigo do país. Quem comanda a cozinha do Tavares, de 226 anos, é José Avillez, de 30. Quando assumiu, há dois anos, o principal desafio do jovem chef foi mudar os pratos sem desrespeitar a história do lugar.
Deu certo. Com opções arrojadas e o rompimento com a culinária praticada pelos antigos chefs, neste ano o Tavares ganhou a primeira estrela do "Guia Michelin". Leia trechos da entrevista.

Folha - O que você mudou na cozinha do Tavares? José Avillez - Tudo! Respeito a história do Tavares, mas fiz uma ruptura total com seu passado culinário.

Foi essa ruptura que o levou à estrela do " Guia Michelin"?
Temos de olhar o que efetivamente conseguimos em termos de qualidade nessa reestruturação da cozinha.
O Tavares estava passando por anos complicados, com a entrada e saída de chefs e falências. Não foi fácil porque a expectativa de muitas pessoas era a de que eu não conseguiria fazer nada, mas nós conseguimos.
Em menos de dois anos recebemos uma estrela e colocamos o restaurante cheio quase todos os dias.

Como é a cozinha que você pratica no Tavares?
Estamos fazendo um trabalho que vai buscar os sabores da cozinha portuguesa.
Optei por recuperar pratos da cozinha tradicional, como o bacalhau na brasa, o arroz de mariscos e as amêijoas à Bulhão Pato. O resto são criações inspiradas nos pratos das várias regiões, numa culinária contemporânea.
Isso agrada não só aos críticos estrangeiros, como aos portugueses que costumavam vir ao Tavares. Não é possível agradar a todo mundo. Há os que preferem os pratos que eram servidos antigamente. Mas a maioria gostou e volta sempre.

Qual a diferença do que se fazia e do que é feito hoje?
É um bocadinho complicado explicar, mas o Tavares ficou um tempo fazendo cozinha de pratos mais franceses. Em 2004 ele foi comprado e começaram a ser implantados pratos da alta cozinha. Outros chefs vieram, já tentando fazer essa ruptura com o passado. Mas as coisas não correram muito bem.

Qual o segredo do ovo que o cardápio diz que vem da "galinha dos ovos de ouro"?
Não há um segredo muito grande. Há uma técnica aplicada na cozedura do ovo, um ovo biológico fresco.
Ele é cozido em banho-maria a 63,5 por 40 minutos por causa da coagulação da gema e da clara, que atingem os pontos certos nessa altura.
É um ovo muito cremoso, em que a gema está líquida, mas não totalmente, e a clara está no ponto certo. Coloco alguns sabores terrosos no prato, como cogumelos.

Qual é o seu prato preferido?
O que eu chamo de "mergulho no mar", um robalo que é cozido em baixa temperatura e é fervido com algas.

Você chegou a fazer estágio no elBulli. Como foi sua trajetória até aqui?
Fiz cursos com Allan Ducasse, estagiei com grandes chefs em Paris e tive um restaurante em Cascais.
Andei também pelo Brasil, para fazer consultorias entre Rio e Angra. Abri um bufê, fui trabalhar com o Ferran Adriá no elBulli e passei lá três meses. Acho que foi o grande marco na minha vida.

Você é muito jovem. Há um conflito de geração entre a sua cozinha e a velha guarda portuguesa?
A cozinha, como tudo na vida, é fruto do nosso percurso. Chefs 20 anos mais velhos do que eu a vivenciaram de uma maneira diferente. Eu recebi grande influência da cozinha espanhola, tive a oportunidade de viajar muito. Não sei se conflito é a palavra, mas há diferenças.

Você conhece chefs brasileiros? É fã de algum deles?
Sim. Gosto muito do Alex Atala. Ele veio jantar aqui três semanas atrás. Eu já mandei um estagiário meu passar alguns meses com ele.
E não é só pela cozinha do DOM, ao qual já fui cinco vezes. Ele é uma pessoa extraordinária e importante na construção de uma nova cozinha brasileira.

Como definiria a cozinha portuguesa?
Só experimentando!


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