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VULCÃO DE CORES
Floresta transborda de mistérios e heranças maias
Passeio arqueológico de três horas recompensa visitante com saborosas noções do povo que viveu ali
DA ENVIADA ESPECIAL À GUATEMALA
É caminhando no meio da
floresta de Petén, a 506 quilômetros da capital guatemalteca, que acontece o passeio por
um dos sítios arqueológicos
mais misteriosos do planeta,
também conhecido como "o
mundo perdido dos maias".
Ouvir vozes ou perder a bolsa
no meio da caminhada e encontrá-la, por acaso, metros à frente, escondida em algum canto,
fazem parte do programa. Pelo
menos, é o que garantem os
guias turísticos mais velhos de
Tikal, um dos maiores centros
da civilização maia já descobertos. Eles garantem que quem
prega essas peças nos visitantes
são os espíritos que habitam o
local, só por diversão ou para
darem o ar da graça.
O significado do nome comprova a história que, de tão bem
contada, faz com que os turistas
prossigam a aventura com bolsas e máquinas fotográficas coladas ao corpo: em um dos dialetos locais, "tikal" quer dizer
"lugar de vozes" ou "lugar de
línguas". Se o que os guias contam for verdade, os 560 quilômetros quadrados desse parque nacional, aberto à visitação
há 60 anos, são pequenos para
os espíritos de uma civilização
que, no seu auge (entre os séculos 200 e 800 d.C.), já contou
com uma população entre 100
mil e 200 mil habitantes.
Durante a visita da reportagem, nada de sobrenatural
aconteceu e ninguém ouviu barulhos que não os das vozes dos
próprios guias ou turistas. No
máximo chegava, baixinho,
sons de animais -principalmente macacos e pássaros-
que povoam a mata, cenário do
percurso de cerca de três horas.
Mas, de fato, há algo de mágico em subir as centenas de degraus dos templos onde eram
realizadas cerimônias religiosas, contemplar o que já foi um
palácio, uma prisão, uma casa
ou uma praça ou ir para um
campo onde os locais se divertiam com seu jogo predileto,
muito parecido com o futebol.
A caminhada é longa e, quando você pensa que acabou, surge, no meio do nada, um templo
que vai surpreendendo no seu
tamanho, quanto mais perto se
chega dele. A Pirâmide 4, com
72 metros de altura e construída no ano 470 d.C. é a maior.
Não são todas as ruínas restauradas que têm uma utilidade conhecida. Não há como deixar de se perguntar, por exemplo, o que levava os governantes da época a construírem monumentos de pedra tão altos e
imponentes. Até porque a
maior parte deles é maciça, sem
nenhum tipo de câmara interna. "O tamanho estava relacionado a disputas políticas. Era
pela monumentalidade que se
media o poder", explica Eduardo Natalino dos Santos, 37, professor de América Pré-Hispânica do Departamento de História da USP (Universidade de
São Paulo).
Esses templos eram feitos
com um tipo de arquitetura que
foi herdada dos zapotecas, povo
anterior aos maias. As chamadas pirâmides escalonadas não
terminam apontando para o
céu, mas em uma plataforma,
de onde é possível visualizar
imensa parte do parque. Dá pra
dizer que o que vemos hoje é
uma espécie de palco gigante
onde eram realizados atos públicos, de cunho político ou religioso. Por isso, as escadas. Essas construções, originalmente
multicoloridas, ficavam próximas às casas da elite da época. A
população vivia nos arredores,
em casas de madeira que não
resistiram ao tempo.
A atividade básica era a agricultura, principalmente o cultivo do milho. Não havia moeda,
mas, nem por isso, o comércio
deixava de existir. Tecidos, alguns tipos de pedra e plumas de
aves tropicais giravam a economia, à base de trocas. Cada cidade tinha um governo próprio, mas um centro conhecido
como Tikal dominava vários
outros. Quando um soberano
morria, outro era escolhido por
consenso. Geralmente, elegia-se um parente próximo.
Medicina e beleza
Durante a caminhada entre
um monumento e outro, vale a
pena não se distanciar muito do
grupo. Primeiro, claro, para
não se perder. Depois, para conhecer parte da vegetação que
fazia parte da vida daquela civilização. Se o guia pedir para que
a turma mastigue uma semente
que deixa a sensação de dormência na boca, não se assuste.
O efeito passa logo e você vai
conhecer o que os maias utilizavam como analgésico para
procedimentos médicos, como
arrancar um dente.
Quem sentir indisposição estomacal durante o percurso
não precisa se preocupar: basta
pedir ao guia que, no caminho,
encontre o "remédio" que o povo mastigava quando tinha dor
de barriga. Entre as plantas
mais inusitadas, estão as que
eram mais utilizadas pelas mulheres: uma que fazia as vezes
de pílula anticoncepcional e
outra que rendia a elas uma receita de beleza. Esta última é
cobiçada hoje por famosas
marcas de cosméticos, que precisam da planta como ingrediente das fórmulas de cremes
para rejuvenescimento.
(PPR)
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