|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TV NO MUNDO
Programa celebra a arte negra
ESTHER HAMBURGER
em Austin
Duas semanas após a
crítica feita por Spike Lee
ao novo seriado de Eddie
Murphy, "The PJ's", a rede pública dos EUA, PBS,
exibiu o documentário
"I'll Make me a World",
sobre os cem anos de arte
afro-americana.
Na introdução do programa, no seu usual tom
provocativo, o mesmo Spike Lee afirma que sem a influência negra a cultura
americana seria inóspita. E
as biografias ilustradas dos
inúmeros artistas negros
sugerem que o cineasta
tem razão.
Na mesma linha de promoção da auto-estima negra, o cineasta Van Peebles
arrisca uma constatação
nada vitimizadora. Para o
jovem artista negro, às vezes é possível tirar vantagem do racismo, pois pode
ser mais fácil surpreender
quando ninguém espera
que você seja articulado.
As seis horas de programa, exibidas em três episódios, documentam o legado de artistas famosos,
criadores do jazz e do
blues, atores, bailarinas e
escritores.
O documentário chama a
atenção para a contribuição dos soldados negros
para a vitória americana
nas duas guerras mundiais, apesar da segregação
formal a que os negros ainda eram submetidos. A esperança dos patriotas negros que retornam à casa
depois de contribuir para
espalhar influência americana no mundo é repetidamente frustrada, como o
racismo do filme "O Nascimento de uma Nação"
ilustra bem.
Como se sabe, mas é
sempre chocante lembrar,
apesar de iguais perante a
lei, até muito recentemente negros eram proibidos
de ficar nos mesmos hotéis, representar nos mesmos palcos, frequentar as
mesmas escolas que os
brancos. Esse apartheid levou, por exemplo, a carreira da bailarina Raven Willkinson, mulata de pele clara, a um fim prematuro,
nos anos 50, após anos de
performance em uma
companhia branca que tolerou e ocultou a identidade racial da bailarina.
A série é povoada de histórias, nomes e lugares.
Nova Orleans, Nova York,
Filadélfia e Chicago se destacam do sul, tratado genericamente como o reduto
da violência mais acirrada.
Betsy Smith, James Baldwin, Dizzy Gillespsy,
Johnny Parker, Duke Ellington, Koko Taylor,
Wynton Marsalis, Bill Jones, Cornell West, entre
outros, aparecem para
conferir qualidade e emoção inquestionável ao cânon afro-americano.
O tom geral politicamente correto do programa
não impede que algumas
tensões no interior dessa
tradição apareçam. A
questão maior, tratada
com muita discrição, é sobre a possibilidade da arte
engajada. Mas levar esse
questionamento até as últimas consequências implicaria talvez construir uma
representação do cânon
americano, que incorporasse o conflito racial nos
Estados Unidos.
E-mail: ehamb@uol.com.br
Texto Anterior: Próximos capítulos Próximo Texto: Parabólicas Índice
|