São Paulo, domingo, 15 de setembro de 2002

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TRAMA DIFERENTE

"Turma do Gueto", série que a Record lança em outubro, vai tirar os negros da eterna posição de coadjuvantes na dramaturgia televisiva

No papel principal

RODRIGO RAINHO
DA REDAÇÃO

A ESTRÉIA da série "Turma do Gueto", marcada para a última quinta-feira de outubro, às 22h, na TV Record, promete inovar a dramaturgia televisiva colocando negros nos papéis principais. "O sonho do Netinho [de Paula, ator e co-produtor" é que o negro pudesse participar fora da condição de serviçal", diz Pedro Siaretta, diretor-geral dessa produção independente.
"Turma do Gueto" narra a história de Ricardo (Netinho), professor de ensino superior que retorna à periferia de sua cidade natal, São Paulo, para trabalhar na escola pública Quilombo. Nessa volta às origens, reencontra dois amigos com destinos diferentes: Jamanta (Nill Marcondes), traficante de drogas, e Edson (Jorge Marcondes), desempregado. Revê também Tina (Ana Paula Demambro), a ex-namorada, e se envolve com a aluna Pamela (Adriana Alves). No meio do caminho, aparecem os problemas enfrentados diariamente pela população pobre, como fome, violência e drogas. "Turma do Gueto" terá a dinâmica e a agilidade das séries americanas. Vamos mostrar a realidade da periferia e a ascensão social dos negros", diz a roteirista Laura Malin, que tem a experiência internacional de colaborar em roteiros das séries "Will & Grace" e "Os Simpsons". "Veremos os brancos em papéis secundários, não vamos tratar da vida burguesa. É um foco inovador", diz ela. A primeira temporada terá 16 episódios, com duração de uma hora e meia cada um. A história é fechada e tem três núcleos (alunos, professores e comunidade local). Segundo Siaretta, cada capítulo tem custo de R$ 150 mil, divididos entre Netinho e a produtora Casablanca. Atores de grupos de teatro do Capão Redondo, Simony, Compadre Washington (ele mesmo, do grupo musical É o Tchan), Big Richard e Afro X estão no elenco. A atriz profissional mais conhecida é Samantha Monteiro, que faz o papel de Lea, uma professora de ciências, o quinto personagem dela em TV. A mais recente atuação aconteceu na novela Marisol, exibida pelo SBT.

Distorção
Para o cineasta Joel Zito Araújo, autor do livro "A Negação do Brasil, o Negro na Telenovela Brasileira" (Ed. Senac), a iniciativa de produzir uma série com elenco de maioria negra é "bem-vinda". "Somos um país multiracial, mas o que predomina na TV é uma estética distorcida, a ideologia do branqueamento, que tenta passar uma idéia de Primeiro Mundo. É um atraso e uma atitude preconceituosa", afirma.
Araújo, no entanto, tem uma preocupação: "É muito boa a iniciativa do Netinho, pode criar um novo estilo, mas meu temor é de que os negros sejam representados apenas em suas vivências nas favelas, como em "Cidade de Deus". Temos 8 milhões de negros nas classes médias. Os afrodescendentes querem ver histórias bonitas de negros".
As gravações de "Turma do Gueto" são feitas em uma cidade cenográfica de 3.000 metros quadrados, erguida no bairro paulistano da Bela Vista, e em outros dois estúdios da produtora Casablanca. A captação de imagens é digital, e a direção segue conceitos do cinema.
A idéia é transformar a série em um filme. "O professor vai passar mensagens positivas ao telespectador. Ele acredita no seu sonho e começa a mudar a comunidade", diz Claudio Callao, diretor-assistente da série.
O ex-jogador Pelé gravou algumas chamadas de "Turma do Gueto" e se ofereceu para participações especiais.



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