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São Paulo, domingo, 18 de maio de 2003

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Mesmo com o sucesso dos últimos filmes brasileiros no cinema, eles ainda são uma raridade na TV aberta, onde, quando exibidos, conseguem boas audiências

Sem cartaz

Divulgação
Cena de "Lavoura Arcaica", que não vai para a TV


FERNANDA DANNEMANN
DA REPORTAGEM LOCAL

APESAR da boa audiência que alcançam na TV aberta (veja quadro), os filmes nacionais da nova safra ainda são raros na TV brasileira, onde reinam as produções norte-americanas. Na Globo, que veicula aproximadamente 120 filmes por mês, neste ano foram exibidos dez nacionais. Na Rede TV!, na Record e no SBT, só há títulos estrangeiros. Na Gazeta, nem isso. "São poucos os filmes nacionais e, geralmente, são co-produzidos pela Globo, com seus artistas. Se liberassem os filmes com a Xuxa, com o Antônio Fagundes e com o Rodrigo Santoro para o mercado, o SBT seria o primeiro a exibi-los", posiciona-se o canal de Silvio Santos, através da assessoria de imprensa. A Band, que diz ter obtido "ótimo retorno" com a sessão "Cine Band Brasil", agora está dando preferência aos programas ao vivo. Filmes, só clássicos estrangeiros nas noites de domingo. A TV Cultura não exibe filmes de fora e veicula oito nacionais por mês. São longas antigos e co-produções de que a emissora participou através do PIC-TV (Programa de Integração TV-Cinema), que gerou investimento em 48 filmes, 19 ainda inéditos no canal.

Hegemonia
"A TV sempre procurou o "blockbuster", mas, atrelado a ele, vem um pacote de filmes ruins. É a política americana de hegemonia cultural no planeta. Se não controlarmos, vamos continuar vendo enredos violentos, racistas e conservadores", diz Toni Venturi, diretor de "O Velho", sobre o líder comunista Luiz Carlos Prestes, e o premiado "Latitude Zero", inédito na TV. Fernando Meirelles, diretor de "Cidade de Deus", diz que a produção nacional ainda é pequena. "Se uma emissora quiser programar um filme nacional por semana, precisará de 68 por ano. Em 2002, que foi espetacular, foram lançados pouco mais de 50", afirma. "Cidade de Deus", aliás, será exibido na Globo em 2004, numa versão com os 42 minutos cortados do original, em quatro episódios de 45 minutos. Walter Salles, diretor de "Central do Brasil", exibido três vezes na Globo -na primeira, em 1999, teve 49 pontos no Ibope (cada ponto equivale a 48,5 mil domicílios em SP)- preferiu publicidade na emissora para o lançamento ao pagamento em espécie. "Em dinheiro, o valor não teria ultrapassado o de um filme americano feito para a TV", diz Salles. "A Globo só veicula filmes da Globo Filmes, e isso é uma distorção. Não dá para promover só a prata da casa", diz Toni Venturi. Mas o diretor Luiz Fernando Carvalho, mais conhecido do público pelas novelas que dirige na Globo, não teve a co-produção da emissora no longa "Lavoura Arcaica". Segundo ele, o filme "não será vendido para nenhuma TV do mundo". "Nunca me interessei por qualquer acordo com as TVs por entender que o filme e eu seríamos sacrificados. "Lavoura" dificilmente poderia ser dividido para a entrada de comerciais", afirma.

Preço
Se há uma unanimidade entre os cineastas brasileiros, é quanto ao preço pago pelas emissoras. "Você negocia durante meses, e os valores são muito, muito baixos", diz Sara Silveira, produtora de "Durval Discos" e "Bicho de Sete Cabeças".
"Quando você consegue uma boa venda, não passa de R$ 10 mil. Eu nunca vendi filmes para a TV aberta por total falta de interesse dela", afirma.
"É uma vergonha. Um filme brasileiro que fez 2.000 espectadores no cinema vale menos do que um americano com o mesmo público. No caso da Globo, eles pagam de três a quatro vezes mais pelo filme estrangeiro", diz Meirelles.
Carla Camuratti, diretora de "Carlota Joaquina", considerado exceção por ter sido vendido para a Globo por R$ 60 mil, há três anos, acredita numa "visão errada de marketing por parte das TVs".
Ela diz que não foi procurada para negociar seu "Copacabana".
Andrucha Waddington, que prefere não divulgar por quanto vendeu "Eu Tu Eles" para o canal pago HBO e para a Globo -onde o filme estreará ainda neste ano-, concorda.
"Se não houver uma reestruturação das leis em relação à produção nacional, será difícil haver uma mudança", diz.
"As TVs brasileiras não atuam como concessões públicas nem ajudam na democratização audiovisual. Funcionam como cartórios eletrônicos", diz Salles.
Ugo Giorgetti, que se prepara para filmar "Boleiros 2", crê que a TV deveria abrigar os cineastas: "Cinema não é diferente. Poderíamos fazer minisséries. O que eu quero é me expressar".


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