São Paulo, domingo, 27 de maio de 2001

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CRÍTICA

Está tudo bem

LUIZ CAVERSAN

ESTÁ tudo muito bem na televisão brasileira.
As principais redes seguem mais ou menos estacionadas em patamares de audiência que mantêm um "status quo" que convém a elas, emissoras, e a seus executivos. Porque convém também ao discurso de que a concorrência está acirrada.
Todos fazem tudo o tempo todo para tentar deixar claro que, sim, a disputa pelo público está superaquecida, e que todos estão o tempo todo trabalhando com novas "idéias" para "alavancar a audiência". Hã, hã...
Vejamos o domingo, por exemplo. O domingo virou aquele dia em que as pessoas normais tentam relaxar, enquanto um monte de gente ligadíssima fica, nos principais canais, enfiando "notícias ao vivo" goela abaixo da audiência.
SBT, Globo, Record (e em breve a Band) estão nessa de "informações de última hora" que não interessam.
Quem quer tanta notícia aos domingos? A pergunta foi feita em enquete do TV Folha, e a maioria dos leitores respondeu que não quer um noticiário que dê importância maior a fatos menores.
Mas trata-se de uma tendência que "pegou", se alastra e todos (dentro das emissoras, claro) acham que está tudo bem: faz parte da "concorrência".
Sem dúvida, disputa-se muito na TV brasileira. E o que emerge dessa corrida às cegas pelos sagrados pontos do Ibope é uma desatinada opção pelo mau gosto.
Na verdade, tenta-se corresponder a um "gosto comum" com iniciativas de baixo nível.
Alguém discorda de que a maioria da população brasileira é de baixo nível: escolar, econômico, estético?
É por isso que a programação da televisão brasileira aberta fica cada vez mais descarada e assumidamente "trash". Em alguns momentos, o televisor se assemelha a uma verdadeira janela para o inferno.
Mas também é preciso atender à elite!
É mesmo?
Então, chama a Vera Loyola.
Vera Loyola está chegando e, como se sabe, no Rio de Janeiro e em outros cantos, ela é "celebridade", dá entrevistas, aparece nas colunas, frequenta as revistas de "gente" com singular regularidade e serve de exemplo ao mundo emergente, inculto e brega, mas que, gostemos ou não, constitui boa parte da elite endinheirada deste país.
Vera Loyola é a mais autêntica especialista em si mesma que existe. Vera Loyola é loira, terá um sofá e vai entrevistar pessoas. Ou seja, ousará ser Hebe na vida.
É aguardar para sentir o drama.
Quem sabe é ela que vai elevar o nível e fazer frente aos kleberes e mallandros, ridículos profissionais e amadores que infestam o vídeo?
Por falar nisso, como anda o nível global? Depois do sucesso estrondoso da caretice de Sandy, agora veremos Cláudia Raia de transexual. Seria perfeito, não fosse o Ministério da Moral e dos Bons Costumes, ou Ministério da Justiça, capitaneado pelo dinâmico José Gregori.
O MMBC não quer Cláudia Raia de "traveca" às 19h. Só depois das 20h. Compreensível, essa exigência. Afinal, a novela das oito que é a novela das oito está tão comportada que se torna inconcebível "aberração" como um transexual às sete.
Quem vê a atual novela das oito já percebeu que não há sexo nem línguas. Saudades de Vera Fischer e do "ator" Giannecchini na trama anterior. Como chamava mesmo?
Não importa.
O fato é que a ação mais "forte" que pintou no porto onde ainda não ocorreu nenhum milagre foi o Fagundes arrancando a roupa da Cassia Kiss, enquanto ela gritava. Pensou que fosse surra, mas era excitação mesmo.
Conclusão: não rolou nada que se pudesse ver.
Mais um motivo para o MMBC ser tão zeloso é a outra futura nova novela das... bem, a nova novela que se chamará "A Padroeira". Ela terá a santíssima Nossa Senhora Aparecida como elemento-chave da trama.
A mesma Nossa Senhora, diga-se, que é uma campeã de audiência. Na TV Cultura de São Paulo, a missa transmitida ao vivo da Basílica de Aparecida é o "programa" nš 1 no Ibope. Outro exemplo de que está tudo bem na TV do maior país católico do planeta.
A Aparecida da Globo será, não se deve esquecer, cercada pelas tramas de Walcyr Carrasco, que já se tornou um expert no ramo "clássicos para todos". A ver.
Voltando à novela em que Claudia Raia, enfim, será um travesti, espera-se um show de milhões -pelo menos em cachês. As "filhas" da "mãe" Fernanda Montenegro (que mais uma vez emprestará sua verve à diversão ligeira) pertencem ao primeiro time da Globo, assim como os demais destaques do elenco. Alguns nomes? Thiago Lacerda, Andréa Beltrão, Beth Coelho, Regina Casé, Raul Cortez, Alexandre Borges, Tony Ramos...
Um timão, não é verdade?
No entanto, um time semelhante a tantos outros do passado, de novelas que sobrevivem na memória dos mais ligados no gênero.
Ou seja, continua tudo bem na TV brasileira.
E tudo igual.



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