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IVAN FINOTTI ivan.finotti@grupofolha.com.br

Vingança verde

Certos estratagemas maquiavélicos do capitalismo me fizeram optar por um Maverick 74

Existem várias razões para se ter um carro antigo, e a praticidade certamente não é uma delas.

Alguns têm porque amam carros. Desde pequenos são fascinados pela máquina e agora, crescidos e com grana, escolhem a elegância das charangas vintage em vez da normalidade dos automóveis atuais.

Outros herdaram. Um Fuscão na família desde 1967 ou um Corcel 2 do papi tem seus encantos, pode crer, e costuma funcionar como uma madeleine de Marcel Proust.

Meu caso, porém, foi um ato tardio de rebeldia adolescente. Faz uns oito anos, eu tinha um Corsa Sedan 1.0. Estava pensando em trocar por um Astra, mais luxuoso, num legítimo passo de ascensão pelo trabalho, subindo de vida com o suor do rosto, um passinho depois do outro.

Na época, eu trabalhava em uma revista e participei de uma reunião de editores com o pessoal da publicidade. Como se tratava de uma publicação para jovens, discutia-se a inclusão de anúncios do automóvel Gol. "O primeiro carro do garoto", diziam os publicitários.

Para outra revista, falaram no Golf, pois "esse cara cresceu e já tem mais grana." Uau, aquilo era óbvio pra caramba, mas, para a minha cabecinha de jornalista, e não de propagandista, foi uma revelação.

Fiquei com o estômago embrulhado por me ver refém dos estratagemas maquiavélicos do capitalismo. Minha vida estava sendo escrita por aqueles caras, ó, céus!

Voltei para casa, conversei com minha mulher e no dia seguinte acionei o amigo Ricardo Valladares, que dirigia um Puma 1979 conversível verde-musgo, além de um Karmann Ghia 1966 vermelho.

Em uma semana, ele encontrou um carro "novo" para mim: este Maverick 1974 aí de cima.

Vendi o Corsa uma semana depois daquela reunião fatídica. E fiquei dois anos andando pela cidade de charanga verde, saboreando minha vingança contra os deuses da publicidade. "A quem eu estava enganando?", você pode perguntar. A mim mesmo, oras, mas foi legal!

Depois comprei outro carro, mais fácil de manobrar, de deixar no estacionamento, de fazer seguro, mais prático, enfim. Mas é claro que não larguei o Maverick. Porque, nele, eu me sinto no meu próprio mundo.

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