São Paulo, domingo, 15 de dezembro de 2002

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Mesmo com seguro, rastreamento e assistência, motoristas não dispensam proteção divina para seus carros

Rodar com fé

Fernando Moraes/Folha Imagem
Carro é defumado na cachoeira do Santuário Nacional de Umbanda, em Santo André


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Alguns motoristas não crêem que o seguro, um serviço de rastreamento e uma boa rede de assistência sejam suficientes para proteger seu automóvel de todos os males. Para eles, isso tudo não dispensa uma ajuda divina.
Não importa a religião. Entre católicos, evangélicos ou umbandistas, é possível encontrar quem tenha o hábito de invocar entidades superiores para evitar acidentes, furtos e até pneus furados.
Para o primeiro grupo, a data mais marcante no que diz respeito a segurança veicular é 25 de julho, dia de São Cristóvão, padroeiro dos motoristas. Nesse dia, na paróquia de São Cristóvão (SP), chegam a se formar filas de veículos em busca de uma bênção. Até 20 mil recebem a graça.
Para o padre Sérgio Henrique Nouh, 49, o ritual não é sinônimo de segurança. "Mais importante é a fé. Sem ela, não adianta nem o papa abençoar." Frei Rubens Sevilha, 43, da paróquia Santa Terezinha (SP), conta que os donos procuram o apoio espiritual principalmente quando trocam de carro, vão fazer uma viagem longa ou tiveram alguma experiência ruim, como um acidente.

"Drive-thru"
A igreja de São Judas Tadeu (SP) concede bênçãos de segunda a sábado, a cada meia hora. As pessoas comparecem à capela com as chaves e, quando pedem, o reverendo vai até o veículo.
Com um aspersório, borrifa água benta e profere orações por cerca de cinco minutos. Segundo o padre Eloi José Schons, 48, desde donos de "populares" aos de luxuosos procuram a igreja.
Nos templos ou terreiros de umbanda e de candomblé, pais-de-santo podem, por exemplo, defumar o veículo. O procedimento consiste em queimar algumas ervas em um recipiente, o turíbulo, e fazer com que a fumaça, ao envolver o carro, "propicie uma limpeza e retire as energias negativas", explica Liliana de Araújo Tófoli, 42, a Liliana d'Oxum, presidente da Associação Centro de Mamãe Oxum, Pai Guiné e Caboclo da Pedra Branca.
Ela relata outros rituais: banhos de proteção em que água com ervas fervidas ou com sal grosso é borrifada no automóvel. Talco branco e até sangue de animais podem ser utilizados.
Pendurar terços, sininhos ou patuás (amuletos), constituídos de sementes como as de olho-de-boi, também é recomendado.
No Santuário Nacional de Umbanda, em Santo André (SP), há uma cachoeira de águas límpidas, abençoadas por Mamãe Oxum. Lá, veículos se postam ao lado da corredeira para uma purificação.
"A cerimônia acontece com 50 carros por mês", calcula Ronaldo Linares, 70, presidente da Federação Umbandista do Grande ABC.
A seita Seicho-No-Ie, por sua vez, fornece um adesivo que deve ser colado no veículo para proteção. A presença do carro na sede da organização não é necessária.
Nas igrejas evangélicas, não há rituais específicos para automóveis, apenas iniciativas isoladas. Na Universal do Reino de Deus, por exemplo, a pedido dos fiéis, os pastores costumam ungir veículos com azeite. (EDSON VALENTE)


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