São Paulo, domingo, 16 de agosto de 2009

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ENTREVISTA

KEITH RYDER

Peugeot 307 nasceu para ser hatchback, e não sedã

Há 25 anos na Peugeot, designer inglês fala da picape 207, que virá em 2010, e do fracasso do 307 Sedan

Cabelo grisalho repartido ao meio, terno azul-escuro bem cortado e um sotaque britânico modificado por 25 anos de vida na França. Nada de gravata ou abotoadura. Keith Ryder, 54, fala pausadamente e tem um jeito despojado para quem se formou no Royal College of Art, de Londres, e é diretor mundial de design e estilo da Peugeot. Ele acabou de chegar ao Brasil e terá um ano para uma missão à la Gilberto Freyre: entender os brasileiros e descobrir novos talentos para o grupo PSA Peugeot-Citroën. Ao lado de Ryder, estava o coordenador de produto e estilo para a América Latina, Frederico Cezar Laguna, que falou da picape 207. Confira as entrevistas exclusivas a seguir. (FABIANO SEVERO)

 

FOLHA - Como são separados os processos criativos na PSA Peugeot-Citroën da França?
KEITH RYDER -
Os centros de design em Paris são separados apenas por uma parede. Se entramos à esquerda, vamos para a Peugeot, na cor azul; à direita, para a Citroën, na cor vermelha. Por isso há muita interação entre os projetos. São 250 pessoas em cada departamento, mas muitos servem às duas marcas, como os setores de custos e de industrialização. No estúdio, analisamos novos traços e definimos: este é mais Peugeot e aquele é mais Citroën. Depois, todos almoçam juntos.

FOLHA - Qual é a diferença mais marcante entre o design da Peugeot e o da Citroën?
RYDER -
A Peugeot tem um design bem balanceado, com as melhores proporções entre as formas, como no desenho dos vidros, das rodas, dos para-choques. Também tem linhas dinâmicas, elegantes e distintas, com uma identidade visual muito marcada pelos faróis que parecem olhos. Qualquer um identifica um Peugeot pelo retrovisor. Já a Citroën é mais apegada a detalhes de acabamento, é mais complexa. Tem mais linhas que dão ideia de movimento, sempre acompanhando o desenho do Chevron [logotipo da Citroën] na grade.

FOLHA - O design é o mais importante em um carro?
RYDER -
Sim. Com certeza o design é o fator mais importante para a decisão de compra de um carro. Os custos também são importantes, mas o design é o que mais atrai em um objeto.

FOLHA - Isso explica o fracasso do 307 Sedan? Em julho, a Peugeot emplacou 653 unidades do 307 hatch e apenas 47 do 307 Sedan.
RYDER -
O design, quando é bom, falamos que é bom. Quando não é, também falamos. Mas foi a minha plataforma [na PSA, chamam de plataforma dois, para carros médios] e posso explicar sobre esse carro em particular. O projeto, de 2002, tinha, por motivos econômicos, de preservar o desenho das portas traseiras. Isso faria o carro ter preço competitivo e ótimo espaço interno. Trocar o desenho da porta seria caro, e decidimos mantê-la. Assim como o 307, ficou um teto alto com bom espaço para a cabeça.
Desenhar a silhueta para o sedã era mais difícil por uma questão natural de proporção do carro. Honestamente, quando desenhamos qualquer carro, o fato mais importante é a proporção entre as formas.

FOLHA - Se o sr. tivesse a oportunidade de desenhar o 307 Sedan novamente, o que mudaria?
RYDER -
Obviamente, depois dessa experiência com baixos volumes, não seguiríamos essa mesma direção. Analisaria os custos com os diretores e talvez mexesse na porta para inclinar um pouco a coluna traseira.

FOLHA - Como os japoneses?
RYDER -
Sim. O Honda Civic é um grande exemplo. Estava até falando sobre ele nesta manhã. Para mim, ele não tem um bom espaço interno. Do design, eu gosto. Mas, se você reduz a altura do teto, perde espaço interno. É um outro propósito.

FOLHA - Qual foi o propósito do 207 Passion?
RYDER -
Bom, nesse foram modificados mais itens, com novas portas. Sempre pensamos num programa com várias silhuetas para diferentes tipos de carro, como hatch, peruas, cupês-conversíveis. Mas os sedãs são sempre difíceis de desenhar. Desenhamos uma vez uma picape 307 para cinco pessoas [semelhante à Strada cabine dupla], mas não havia espaço suficiente para as pessoas e para as bagagens na caçamba.

FOLHA - Como foi transformar o 206 em 207 aqui no Brasil? Alguns o chamam de 206,5.
RYDER -
Na Europa, esse carro é chamado de 206 Plus e tem fila de espera. Quando lançamos o 207 europeu, jovens diziam que preferiam o 206.

FOLHA - Mas não era pelo tamanho do carro, e sim pelo preço.
RYDER -
Claro que o preço é importante. Agora temos um carro que fica entre um e outro.

FOLHA - O 206 Plus sempre esteve nos planos da Peugeot da França ou foi uma saída para a crise?
RYDER -
Decidimos atualizar o 206 com o design do 207 em 2005 para vendê-lo no Brasil e na Europa. Quando lançamos o carro no Brasil, em 2008, pensamos em anunciar que ele também iria para a Europa, mas não o fizemos. O anúncio foi feito em fevereiro deste ano.

FOLHA - A Peugeot pretende desenhar projetos novos para mercados emergentes, como o Renault Logan?
RYDER -
Não acredito que um Renault Logan seria o tipo de carro ideal para a Peugeot.

FOLHA - Mas a Renault teve muito sucesso com o carro...
RYDER -
É verdade. O Logan tem um design inteligente, mas não provoca desejos em nenhum comprador. É preciso despertar sonhos. Isso não é simples, é muito complexo.

FOLHA - O sr. está no Brasil para conhecer melhor o brasileiro. Do que o mercado precisa?
RYDER -
Estou há muito pouco tempo no Brasil. Após um ano, espero sentir mais o mercado, as pessoas, as tendências. Hoje só tenho a impressão de coisas típicas, como o futebol, o samba. Também importante para nós foi a personalidade de Ayrton Senna. Ele foi um dos maiores pilotos e desenvolveu importantes conceitos de carros.

 

FOLHA - Quando vocês projetaram a silhueta do 207 já pensavam em fazer uma picape 207?
FREDERICO CEZAR LAGUNA -
[Silêncio]. Bem, se fôssemos produzir uma picape, não seria apenas "cortar" um hatchback e fazer uma caçamba. É preciso ter espaço para diferentes aplicações, como carga, bagagem, moto. É preciso trabalhar bem próximo da engenharia para adaptar a suspensão. A do hatch não é forte o suficiente.

FOLHA - Se o sr. tivesse feito a picape, seria no Brasil ou na França?
LAGUNA -
No Brasil. Esse carro é para esse mercado, e não para o mercado europeu. Pelo menos agora. A Europa não tem tradição em picapes leves. Aqui temos incentivos do governo nesse segmento compacto, voltado para pessoas jovens.
Só posso dizer que, se a companhia decidisse fazer [picape 207], seria benfeito. Analisaríamos os concorrentes, como a Montana, a Arena [nova Saveiro], a Strada. Veríamos o que cada um tem de bom e faríamos algo tecnicamente melhor.


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