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Meu carro, minha casa
Baterista transforma Doblò em estúdio, e Fusca 67 vira guarita no interior de SP
FELIPE NÓBREGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Quando comprou sua Fiat
Doblò no ano passado, o profissional de informática Demian
Quirino, 34, nem perguntou se
a multivan tinha motor "flex".
A única preocupação dele era
saber se, na parte traseira do
carro, havia espaço para montar um miniestúdio, com suporte para a bateria eletrônica.
Cansado de ouvir reclamação
de vizinhos do condomínio onde mora, na zona norte de São
Paulo, Quirino resolveu ensaiar
os batuques na garagem do prédio, trancado na Doblò.
"Todo dia toco de duas a três
horas para relaxar. É um hobby
antigo", diz Quirino, que sonha
em ser músico profissional.
Como viaja com frequência
-e a multivan é o seu principal
meio de transporte-, ele conta
que ensaia até mesmo em estacionamentos de hotéis.
Para o baterista, no entanto,
o lugar mais inusitado em que
ele e a Doblò fizeram um dueto
foi no Rodoanel.
"O trânsito estava complemente parado. Então fui para o
acostamento e fiquei tocando
durante uma hora e meia até
acabar o congestionamento. Eu
era o único ali que não estava
estressado", diz, orgulhoso,
Quirino. Ele até rebate os bancos traseiros do carro-estúdio
para acomodar um banquinho
próprio de baterista.
Pedestais, pratos e bumbo ficam presos num suporte para
não tombar em curvas.
Guarita
Estacionado numa rua pacata de um bairro nobre da cidade
de Votuporanga (519 km a noroeste de São Paulo), um Fusca
1967 "azul-desbotado" chama
mais atenção que os belos jardins floridos dos casarões.
Na cidade de 85 mil habitantes, são poucos os que conhecem a verdadeira história do
Volkswagen Sedan de peças enferrujadas e pneus murchos.
A maioria que transita pela
rua 8 de Agosto durante o dia
deve bater os olhos no precário
Fusquinha e imaginar que o automóvel fora abandonado.
Ledo engano. Há 12 anos, o
carro é a guarita do simpático
vigia noturno da rua, um senhor aposentado de 80 anos.
"Depois que o patrão [dono
do carro] morreu, a esposa disse que eu poderia ficar no Fusca
durante as noites de trabalho",
conta ele, que, com sotaque caipira e jeito simplório, explica o
próprio nome: "Isaac com "c"
morto e Macedo no final".
O Fusca, que o vigia diz lavar
uma vez por ano, ainda tem interior equipado. Entre os acessórios exclusivos, destaque para um coador de café e um saco
com roupas de frio.
Macedo não tem carteira de
habilitação e nunca ligou o veículo. "Eu só tenho a chave da
porta. Não tenho a chave do
motor [ignição]." Explica-se:
até os anos 80, alguns carros tinham fecho diferente até para o
tanque de combustível.
"Sem poder funcionar, o motor "secou", e o pneu se "desborrachou" [sic] todo", diz.
Com um celular "tijolão" e
um canivete de bolso -impecavelmente afiado para descascar
laranja-, o vigia conta com altivez que já evitou um assalto.
"Liguei para a polícia, que correu e pegou os marginais."
Segundo ele, a intervenção
mais apreciada pelos moradores da rua é outra. "Se percebo
algum espertinho estacionando o carro ali no escuro para se
aproveitar das meninas, logo
boto o fulano para correr. Sem-vergonhice, aqui, não!"
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