São Paulo, sábado, 05 de abril de 2008

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MARIA INÊS DOLCI [defesa do consumidor]

OS MERCADORES DO BRASIL

Não sou contra o lucro. Discordo de abusos e explorações ao consumidor praticados pelos bancos

BERTOLD BRECHT, o famoso dramaturgo alemão, dizia que "crime é fundar um banco". Exageros verbais e literários à parte, você sabe que sempre pode esperar por uma nova maldade dos banqueiros. Hoje ou amanhã, ela virá.
O Conselho Monetário Nacional (CMN) sinalizou, com bastante antecedência, que regulamentaria as tarifas bancárias. Em dezembro, advertíamos, em nosso blog, para o risco de um hipertarifaço.
Sem bola de cristal, sem poderes paranormais, acertamos, pois era óbvio que isso ocorreria. Quem sempre se negou a reconhecer o Código de Defesa do Consumidor (CDC), quem reza pela cartilha do "Mercador de Veneza", clássico de Shakespeare, não agiria de outra forma.
O tarifaço chega a escandalosos 150%, em alguns casos. Tudo isso para driblar o Sistema de Divulgação de Tarifas de Serviços, que tem a irônica sigla "Star" (estrela, em inglês). Obviamente, as estrelas, nesse caso, não são os consumidores, mas os banqueiros.
Já falei e escrevi várias vezes, mas não custa repetir: não sou contra o lucro. Não sou contra a cobrança por produtos e serviços de acordo com o mercado. Isso é do jogo.
Discordo de abusos, explorações e desrespeitos ao consumidor. E os bancos continuam jogando pesado, não há como discordar.
Talvez seja decorrência de uma série de dissabores, como a obrigação de respeitar o CDC, definida pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar ação dos próprios bancos, em 2007.
Depois, já em 2008, com a criação das regras para cálculo do Custo Efetivo Total (CET), que tornam mais transparentes os custos abertos e disfarçados que oneram os empréstimos bancários e demais financiamentos. Agora, devem ter se irritado com a padronização da nomenclatura das tarifas, com os reajustes semestrais (ainda assim, uma benesse em uma economia de contratos anuais) e outras exigências.
Até agora, não há no horizonte qualquer nuvem que ameace reduzir os lucros bilionários desses senhores. Os 101 bancos que atuam no varejo no Brasil lucraram, em 2007, mais de R$ 45 bilhões.
Como o jornalista Clóvis Rossi já mostrou na coluna "Socialismo jabuticaba" (Opinião, 17.fev, pág. A2), somente os lucros das quatro maiores entidades financeiras no ano passado superaram o que foi aplicado no programa Bolsa Família. Ou seja, a Bolsa Banco rendeu mais no ano passado.
Nada contra o lucro, reitero, desde que não seja extraído, principalmente, da cobrança de tarifas elevadíssimas, que ajudam a corroer o bolso dos brasileiros, tão esvaziado por impostos que nada geram em termos de serviços -é só ver o que a dengue está causando a milhares de famílias brasileiras.
Portanto, que os mercadores de Veneza, digo, banqueiros, revejam o tarifaço e respeitem o consumidor e as leis que o protegem no Brasil. É o mínimo que se pode exigir de quem tem recebido tanto e tem devolvido tão pouco ao conjunto da sociedade brasileira.


http://mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br

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