São Paulo, sábado, 07 de junho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MARIA INÊS DOLCI [defesa do consumidor]

FILHOS DO PAI

Não é o Brasil que não muda. Somos nós, filhos resignados do PAI, o Programa de Aceleração da Inflação

ENQUANTO A AGÊNCIA Nacional de Telecomunicações (Anatel) discutia, no começo da semana, se a proibição da cobrança de ponto-extra de TV a cabo era para valer mesmo, pensava em uma freqüente afirmação dos economistas, de que o Brasil afasta investidores pela insegurança jurídica. E para o consumidor, não vale essa exigência? Por que o consumidor tem de engolir a seco o mico da TV digital?
Dei uma busca na internet, em um dos sites que comparam preços de produtos, e só encontrei um conversor para TV digital por menos de R$ 600, ainda mais que o dobro dos prometidos R$ 200.
Aliás, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, falava, em 2006, em conversores mais simples, por R$ 100, e até por 43 dólares (cerca de R$ 70, ao câmbio da última terça-feira). Não é fantástico?
Alguém já percebeu os benefícios e avanços propiciados pelo Estatuto do Torcedor?
Também não me lembro de encontrar, em farmácias, os tais remédios fracionados, para reduzir os gastos de quem necessita, por exemplo, tomar apenas cinco cápsulas de um medicamento.
O recall do Fox, da Volkswagen, demorou dois anos e várias pontas de dedos para sair.
No sistema financeiro, os bancos deveriam ter um pacote básico de tarifas, sem reajuste por seis meses. O que fizeram? Aumentaram exageradamente o que já era caro, antes que começasse a valer o semestre sem majorações.
Pesquisas sobre qualidade de produtos vendidos em supermercados continuam sem ser divulgadas, por ordem judicial, atendendo a ação impetrada por supermercados, para proteger suas marcas próprias. Eventuais danos à saúde dos consumidores não foram levados em conta nas sentenças.
Dois governos (FHC e Lula) cobraram o imposto do cheque sob a alegação de que se destinava à saúde. Os hospitais públicos continuaram com doentes amontoados no corredor, ou em uma via-crúcis em busca de atendimento. Consultas e exames são sempre postergados para as calendas gregas, ou seja, nunca.
Em dezembro, a maldita contribuição foi derrotada, mas agora uma malta se reúne para reativá-la, repetindo a cantilena da saúde.
São só alguns exemplos, porque não dispomos de todas as páginas deste jornal.
O que está por trás disso é o poder dos lobbies empresariais e políticos, contraposto à nossa placidez, à nossa acomodação. Não podemos aceitar mais esse desrespeito. E nem disfarçar nosso imobilismo com argumentos do gênero "o Brasil é assim mesmo".
Em todo o mundo, outros países nos olham com admiração e inveja, pois a cada semana se descobre um novo poço de petróleo, produzimos álcool combustível, temos uma poderosa agroindústria e avanços em várias áreas da economia.
Não é o Brasil que não muda. Somos nós, brasileiros, filhos conformados do PAI, o Programa de Aceleração da Inflação.


Texto Anterior: Fashion Rio: Por um biquíni sustentável
Próximo Texto: Promoções (Dia dos Namorados)
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.