São Paulo, sábado, 16 de fevereiro de 2008

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MARIA INÊS DOLCI
[defesa do consumidor]

MANUAIS AMIGÁVEIS


Os manuais deveriam ser simples, diretos e destacar no primeiro capítulo os riscos contidos no produto


V OCÊ JÁ TENTOU utilizar o manual do novo eletrodoméstico, eletroeletrônico, microcomputador ou automóvel que acabou de comprar? Se responder sim, com sinceridade, será um dos poucos brasileiros que fazem isso habitualmente, antes de utilizar o produto pela primeira vez.
Outra pergunta para aqueles que realmente lêem os manuais de instruções: vocês entenderam todos os itens que constam desses livretos? Não ficaram com dúvidas?
Pois é, os manuais deveriam ser simples, diretos, objetivos e indicar com destaque, talvez em seu primeiro capítulo, os riscos para o consumidor contidos naquele determinado produto.
Seria algo assim: "Cuidado ao manipular o banco traseiro de seu Fox. Não utilize a argola de suporte da alça para movimentar o encosto do assento traseiro, nem para aumentar ou diminuir o espaço do porta-malas. A argola poderá cortar parte ou todo o seu dedo".
Parece um exagero? Pois proponho também que esse primeiro capítulo, o dos riscos, venha em corpo maior que os demais caracteres do texto, em vermelho e sublinhado. Assim, quem disser que não leu o manual, que não sabia dos riscos, terá que explicar como não percebeu o texto em destaque no início.
Ainda sobrará um problema relevante: e quem viajar de carona, filhos, amigos, colegas, sogras? Obviamente, caronas não pedem para ler o manual. Nesse caso, o tal primeiro capítulo traria a seguinte advertência: "Avise a todos que usarem o banco de trás, ou o porta-malas, que não utilizem a argola de suporte da alça para movimentar o encosto do banco, nem para aumentar ou diminuir o espaço do porta-malas etc".
Só assim um fabricante de carros como a Volkswagen poderá se eximir de convocar um recall para a tal argola, com o argumento de que tudo estava explicado no manual do proprietário. E não negar o problema e depois afirmar, em um comunicado, que instalaria uma peça adicional, mas que isto, bem, isto não era recall. Nem de longe um recall. Recall, o que é isso, hein?
Recall não é um instrumento de punição dos fabricantes. É, conforme os dicionários, termo em inglês para chamar de volta. Ou seja, chamar os consumidores para resolver um problema que os fabricantes não perceberam antes de entregar os produtos às lojas.
Está expresso no Código de Defesa do Consumidor e é uma forma bem prática de exercer a "transparência" nas relações de consumo.
A propósito, nesta época de predomínio da venda de produtos fabricados na China, é comum que os manuais sejam precariamente vertidos para o português, muitas vezes em um idioma que se aproxima do portunhol, aquele esforço dos brasileiros para falar o espanhol da Argentina, do Uruguai e do Paraguai.
Seria fundamental que algum órgão do governo vinculado aos direitos do consumidor verificasse com rigor os tais manuais. Sei que dá trabalho, mas, afinal, entre um saque e outros dos cartões corporativos, seria uma boa medida.

http://mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br


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