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Em palestra na Casa Folha, Teju Cole lê Drummond e diz ter sofrido preconceito no Brasil
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DO ENVIADO ESPECIAL A PARATY (RJ)
O escritor americano-nigeriano Teju Cole, 37, um dos convidados da Flip deste ano, participou neste sábado (7) da última palestra da Casa Folha, onde conversou sobre literatura e também atacou a imagem da união racial do Brasil, afirmando ter sido vítima de preconceito no país.
Cole iniciou sua apresentação lendo em português os dois primeiros versos do clássico "No Meio do Caminho", de Drummond, e concluiu o poema em inglês, na versão traduzida por Elizabeth Bishop ("Uma das minhas poetas preferidas", disse).
"Para mim, esse é um poema sobre a epifania, um momento que pode ser transformado em algo para a vida inteira. É isso que se faz quando se escreve um romance, você parte de algo simples que pode se tornar memorável."
O escritor também falou sobre os efeitos do 11 de Setembro nos EUA, tema tratado em seu livro de ficção "Cidade Aberta", em que um médico vaga por Nova York pós-atentado. A obra o catapultou para a fama no ano passado e está sendo lançada na Flip.
Ele criticou a Guerra ao Terror disparada pelo governo Bush após os ataques. "Há um tipo de violência entre países e entre pessoas que só pode acontecer se você tem memória curta", disse Cole.
"A falta de conhecimento histórico pode fazer com que um país considere que algo que lhe aconteceu é único, e isso serve como desculpa para se tomar qualquer tipo de atitude. Assim, o Afeganistão foi invadido, mas invadiu-se também outro país, que não tinha nada a ver com isso. É como o sujeito que bate na esposa porque o time de futebol perdeu."
Questionado sobre como se sentiu ao ser comparado a escritores muito distintos, como o alemão W. G. Sebald (1944-2001) e o franco-argelino Albert Camus (1913-1960), o americano disse não se incomodar --ao contrário.
"Me sinto ótimo com essas comparações. O problema é ser comparado com gente que você não admira. É melhor ser comparado a vários autores do que a um só, porque significa que você não está preso em um lugar."
O autor disse suspeitar "das pessoas que dizem que não tem influências, que se julgam muito originais."
"Isso me traz à mente aquilo que falei antes, sobre falta de memória histórica. Toda literatura é uma conversa com outra literatura. Escrevi meu livro tendo em mente que o leitor leu outros livros, esse diálogo com outras obras é o prazer de escrever."
Fotógrafo diletante, Cole também respondeu a uma pergunta sobre as conexões entre foto e literatura.
"É uma conexão que tem ficado mais forte para mim, em parte porque eu escuto muito essa pergunta, então passei a trabalhar nisso. Minha literatura são várias pequenas histórias que vão se ligando, e eu percebo que o que me dá prazer na fotografia não é fazer uma única foto espetacular, mas as conversas inesperadas que é possível fazer entre várias fotos diferentes."
BRASIL, PAÍS DIVIDIDO
Visitando o Brasil pela segunda vez --esteve no Rio há dois anos, e passou dez dias na cidade--, Cole disse que suas observações mostraram um país bem diferente do estereótipo que se tem no exterior, centrado em "diversão, Ipanema, 'joga bonito'".
"O Brasil, infelizmente, tem uma imagem de cartão-postal e, mais recentemente, uma imagem de um capitalismo bem-sucedido. É preciso visitar o Brasil para entender quão profundamente dividido ele é", disse.
"A imagem exterior é a de que o Brasil é unido, resolveu seus problemas de raça, mas eu fiquei chocado. Estive no palco principal [da Flip], [havia] uma audiência de centenas, por que era tão branca? Aqui nessa sala, sou provavelmente a pessoa mais negra. Vamos lá Brasil, você está partindo meu coração."
O autor também disse ter sofrido preconceito em sua recente visita. Apesar das críticas, fez questão de elogiar os brasileiros em geral. "Devo dizer que viajei muito no último ano para divulgar meu trabalho e em poucos lugares as pessoas foram tão afetuosas e interessadas quanto aqui."
A palestra de Cole foi a última da programação da Casa Folha na Flip deste ano. Durante toda a festa literária, a casa recebeu convidados como o autor espanhol Javier Cercas, os cartunistas Allan Sieber e Caco Galhardo e colunistas do jornal como Marcelo Coelho e Luiz Felipe Pondé, sempre em eventos gratuitos.
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