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Para Augusto de Campos, inovações de Décio Pignatari fazem falta à poesia de agora
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AUGUSTO DE CAMPOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
O texto abaixo foi publicado originalmente em 2007 no "Suplemento Literário de Minas Gerais" com o título "Re-Flashes para Décio".
Morto anteontem, Décio Pignatari deixou dramaturgia inédita
Análise: Textos revolucionários do paulista continuam a luzir entre os novos
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Conheci Décio em 1948. Eu tinha 17 anos e vira, publicado por Sérgio Milliet no "Estado de S. Paulo", um poema dele, "O Lobisomem", que me impressionou muito Assistindo a uma mesa-redonda sobre poesia no Instituto dos Arquitetos entrei em contato com ele. Décio, Haroldo e eu passamos a nos encontrar semanalmente para discutir poesia.
A época era muito instigante. Era o momento pós-guerra, que nos trouxe a novidade da literatura inglesa, contrariando a tradição brasileira, pautada pela francesa. Floresciam o Masp e o MAM, a Cinemateca, Bienais, nova arquitetura.
Nas Livrarias Pioneira (especializada em literatura em inglês), Francesa, Italiana nos inteirávamos das últimas novidades. Na casa de discos Stradivarius, em 1952, conhecemos as obras de Schoenberg, Berg, Webern, Varese e Cage pela primeira vez registradas em LP.
Enquanto os intelectuais do primeiro mundo eram basicamente monolíngues e autossuficientes, nós, do 3º, assimilando vários idiomas, fomos devorando tudo e queimando etapas rapidamente com a pretensão de buscar uma síntese fulcrada no critério poundiano da invenção.
Minha edição dos "Cantos", de Ezra Pound, foi adquirida em 1949. Em 1952 já publicávamos a revista-livro "Noigandres", sob o signo de Pound e do trovador Arnaut Daniel, protótipos de poeta-inventor, e conhecíamos o grupo Ruptura dos pintores concretistas.
Era o dado que faltava para completarmos a nossa equação literária, que desembocaria em Mallarmé-Joyce-Pound-Cummings, interagindo com a música de Webern, Schonenberg, Varese, Cage, a arte de Mondrian e Maliévitch, os móbiles de Calder, no momento de deslanche pré-concreto.
Antes de 1956, ano da 1ª Exposição Nacional de Arte Concreta no MAM, já aditávamos à nossa síntese Oswald, João Cabral, Volpi, e mais adiante, quando Haroldo e eu estudamos russo com Boris Schnaiderman, Maiakóvski: "Sem forma revolucionária não há arte revolucionária".
Usando uma caracterização de Pound, quando afirma que a poesia se manifesta por melopeia, fanopeia ou logopeia --poesia onde predominam o aspecto sonoro, visual ou semântico (definições que, como a de inventores, mestres e diluidores, não é absoluta, admitindo mesclas de comportamento)--, eu diria que Haroldo é mais logopaico e melopaico, Décio mais fanopaico e logopaico, eu mais fanopaico e melopaico, pouco logo. Talvez por isso nos completemos tão bem.
Um dos fundadores da poesia concreta, introdutor da semiótica e da teoria da comunicação em nosso país, Décio é marginalizado pela crítica e pela mídia.
Pode ser, por mais agressivo, menos simpático que os "Campos brothers", mas não lhes é inferior, e nunca foi premiado por nada. Prêmios são muito relativos. Dependem da qualidade da comissão julgadora.
Os poetas atuais --especialmente os que se inclinam para a "logopeia", o que Pound chamava de "dança de palavras no intelecto", exigindo desenvolvimentos fraselógicos-- ganhariam muito se conhecessem melhor a poesia pré e pós-concreta de Décio Pignatari, que deu contribuições originalíssimas não só para a poesia visual, mas --o que é menos percebido-- para esse tipo de abordagem do discurso poético.
As suas inovações me parecem pouco assimiladas nesse território --desde o poema "O Jogral e a Prostituta Negra" até o inenquadrável "Noosfera", que também se aventura pelos desvãos intersticiais da prosa-- e fazem falta como "nutrição do impulso" à poesia de agora.
AUGUSTO DE CAMPOS é poeta
Reprodução | ||
"Profilograma DP", poema escrito por Augusto de Campos para Décio Pignatari |
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