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08/12/2012 - 03h19

Crítica: Tragédia recorda que não somos cartesianos

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HORÁCIO LAFER PIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Já são quatro gerações de assombro. E considere-se quatro gerações que passaram pelas experiências humanas mais marcantes do século 20 e 21, o que indica que o capítulo específico de que trata este livro seguirá surpreendente até o fim dos tempos.

Relato histórico do acidente do Titanic é lançado no Brasil

O Titanic foi tudo. Foi luxo, conflito de classes, tecnologia, vaidade e futilidade; foi heroísmo, ousadia, presunção e covardia.

Sua história permitiu constatar, uma vez mais, que o ser humano é mais shakespeariano que cartesiano, razão pela qual cálculos e bom senso não ajudaram em nada o rumo desta tão planejada quanto malsucedida viagem.

Seu naufrágio, em 14 de abril de 1912, pareceu, ainda, ter despertado um mundo para a transição de uma era em que tudo parecia bem para outra, de incertezas.

Até a civilidade e a confiança abriram neste episódio algumas portas para a volta da barbárie e dúvidas. Nem o dinheiro teve novamente o mesmo valor imaginário. A chegada da guerra e o advento do Imposto de Renda pareceram, nos anos seguintes, confirmar a possibilidade de arrombamento de uma suposta caixa de Pandora.

Publicado originalmente em 1955, "Uma Noite Fatídica - O Clássico Relato das Horas Finais do Titanic" (no original, "A Night to Remember"), chega ao Brasil pelo selo Três Estrelas.

Segundo muitos, é o mais bem apurado livro a respeito dos momentos que antecederam o naufrágio daquela que se dizia ser a mais segura nau construída pelo homem.

Fruto do denodo com que Walter Lord entrevistou, com hábil olhar distanciado, dezenas de sobreviventes, este é um livro que influenciou tantos outros, além do cinema (o premiadíssimo filme de James Cameron é um exemplo) e outras artes.

A publicação traz ainda uma extraordinária introdução à edição brasileira, escrita pelo jornalista e crítico Daniel Mendelsohn como artigo para a revista "New Yorker" meses atrás, que mergulha (sem trocadilhos) com talento nas várias dimensões do drama exposto a seguir.

Continua com uma introdução feita pelo escritor Nathaniel Philbrick por ocasião do 50ª aniversário do livro, para finalmente oferecer ao leitor o breve prefácio do autor, que narra a inacreditável história de um romance escrito 14 anos antes do naufrágio pelo desconhecido Morgan Robertson e que terminou sendo um retrato premonitório, sinistro e acabado em detalhes da catástrofe que aconteceria na vida real.

Lord é um tipo interessante. Não floreia, não abusa do leitor, não cede à tentação fácil de romancear uma história que permite qualquer voo em altura e direção. Por vezes é quase seco, contido ou repetitivo, mero coletor de frases e fragmentos capturados dos sobreviventes.

Contudo, e talvez por isso, traz grande realidade ao que nos conta. Não envereda pela crítica analítica: relata, e o faz bem. O texto flui e permite ao leitor divagar, colocando-se nas cenas da tragédia e imaginando suas próprias aflições e reações.

E há matéria-prima para tudo. Da água do mar a -2ºC ao inerte navio Californian, parado a apenas dez milhas e cuja tripulação só percebeu tarde demais o que ocorrera, trata-se definitivamente de uma grande história, atemporal e bem contada.

A posteriori é bastante fácil compreender tanto a excitação por participar da primeira viagem do Titanic quanto a irresponsabilidade que gerou a catástrofe na qual cerca de 1.500 vidas se perderam num mar calmo, belo e, ao mesmo tempo, gelado e mortal. Mas esta é, ainda assim, uma história de mistério: perguntas se arrastam sem respostas até hoje.

O livro termina com fatos e dados a respeito do navio e a cronologia do desastre. Os agradecimentos são, em si, fonte de outras histórias. Por fim, a lista de passageiros, diante da curiosidade mórbida do ser humano, não escapa a uma olhadela.

Belo barco, uma história de histórias, um relato preciso: certamente um bom livro.

UMA NOITE FATÍDICA
AUTOR Walter Lord
TRADUÇÃO Tomás Rosa Bueno
EDITORA Três Estrelas
QUANTO R$ 39,90 (296 págs.)
AVALIAÇÃO bom

HORÁCIO LAFER PIVA, 53, é empresário. Foi presidente da Fiesp/Ciesp (Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) de 1998 a 2004.

 

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