Em 60 anos de música, Brubeck representou o jazz para o mundo
O baterista Joe Morello adorava solar no andamento de 5/4 --por exemplo, nas versões ao vivo da faixa "Sounds of the Loop", já brincando com diferentes tempos em 1957. Foi natural, quando o quarteto decidiu gravar um álbum inteiro construído sobre compassos compostos, como 6/4 e 9/8, Paul Desmond bolar algumas linhas melódicas nas altas oitavas de seu sax alto, sempre suave e delicado. Dave Brubeck, sentado ao piano, juntou as ideias, ajustou estrutura, encaixou o groove do contrabaixista Eugene Wright, criou o inconfundível riff de piano e deu à faixa título: "Take five", hit mundial do álbum "Time Out", de 1959.
Ninguém esperava que, em plena era de nascimento do rock 'n roll, um tema feito sob medida para um solo de bateria em 5/4 pudesse se tornar um hit --em jukeboxes, na rádio, em apresentações ao vivo, em redes de TV. Mas "Take five" era o auge do talento original e fluido de Brubeck e seu quarteto, a criação conjunta de músicos que se entendiam quase sobrenaturalmente e ali definiam definitivamente caminhos possíveis para a música improvisada, um dos pontos máximos do jazz, forma de arte então ainda com apenas pouco mais de meio século de história.
Dave Brubeck, em seu aniversário de 92 anos, para sempre com 91 anos, era um desses músicos cuja figura simplesmente representava o jazz para o mundo. Quando o álbum "Time Out" se tornou globalmente famoso, em 1959, Brubeck já era amplamente reconhecido como um dos melhores pianistas de seu tempo. Durante seu auge produtivo e criativo, ao longo das décadas de 50 e 60, gravou dezenas de discos ao vivo e de estúdio, especialmente pela gravadora Columbia e especialmente ao lado de Paul Desmond e a formação clássica de seu quarteto, com Eugene Wright e Joe Morello.
Virtuose de balanço forte e solos cristalinos, Brubeck sabia tocar com sutileza e elegância, enquanto também exibia proficuidade de notas, sem disperdiçá-las. Disciplinado, estável (foi casado 70 anos com a mesma esposa), branco e erudito, Brubeck era conhecido pela musicalidade leve e precisa, pela facilidade em experimentar ao mesmo tempo em que criava peças populares, pela seriedade com que encarava a música e com que defendia os direitos de sua banda interracial.
Além de um punhado de obras dedicadas a lugares como Eurasia, Brasil, Turquia e fusões próprias de jazz com música folclórica, Brubeck também viajou como embaixador musical patrocinado pelo governo norteamericano a lugares como Japão, Iraque e Alemanha. Compositor produtivo, também espalhou sua influência através de temas notórios, como "The Duke" e "In your own sweet way", este último gravado por Miles Davis, Bill Evans, Chet Baker, Keith Jarrett.
Modelo e inspiração para milhares de músicos em todo o planeta, mesmo depois da intensa fase de viagens e gravações ao lado do quarteto, Brubeck continuou criando, compondo, tocando, desenvolvendo trabalhos orquestrais, trilhas para balé, peças de música sacra e todo tipo de formato em que lhe cabiam inspiração. Em tempos recentes, em alguns discos lançados nos 00 pela gravadora Telarc, seguiu criando obras de rara beleza e entendimento. Se hoje podemos entender o jazz como grande arte americana do século 20, mérito devido, grande parte de seu reconhecimento e influência mundial surgiu pelos dedos de Brubeck e seus mais de 60 anos de música.
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