Apesar de raso, filme sobre transexuais cria debate relevante
Em tempos de avanço conservador em altas esferas da República, é bom que a psicanalista Miriam Chnaiderman traga a discussão sobre transgêneros e homossexuais para o cinema. "De Gravata e Unha Vermelha", seu novo documentário, faz um mosaico com personagens desse universo ainda objeto de desinformação e preconceito.
O filme ouve famosos -como Ney Matogrosso, Laerte Coutinho e Rogéria- e desconhecidos do público. Nas trajetórias, pressões familiares, conflitos na época escolar, dúvidas sobre a própria identidade. Depois, rompimentos com modelos, transgressões, conquista de personalidade.
Não que os relatos sejam parecidos. Ao contrário, ainda que tenham pontos em comum, as histórias mostram experiências múltiplas: homens que se identificaram como mulheres, mulheres que viram homens, homens homossexuais que não abrem mão da masculinidade.
No painel, há gente que desde cedo viu que não se encaixava no papel esperado pela sociedade. E também pessoas que só na maturidade romperam com estereótipos. Depilação, implantes, hormônios, sexo, filhos: visões diversas passeiam pela tela.
Divulgação | ||
Letícia Lanz, da Associação Brasileira de Transgêneros |
Ney Matogrosso fala do relacionamento tenso com o pai. Conta que as audaciosas apresentações nos tempos do grupo Secos e Molhados, nos anos 1970, eram uma contestação à ditadura militar.
Laerte, em depoimento objetivo e denso, reflete sobre modelos sociais e culturais. Suas tiras perpassam a fita, marcando temas.
Diretora de "Dizem que Sou Louco" (1994) e "Artesãos da Morte" (2001), a psicanalista investe nas entrevistas. Em "De Gravata e Unha Vermelha", elas ocorrem em ambientes controlados e coloridos. Há um tom de exuberância e festa que às vezes parece forçado.
Engolfada nessa atmosfera, a diretora não remexe a fundo as experiências dos entrevistados. O documentário cresce quando um deles deixa um hiato na narrativa e não esconde o choro. Num país de corte conservador, a intolerância produz tristeza. Para além de maquiagens e roupas excêntricas, a vida de quem foge do padrão exige coragem.
No filme, de feitio leve, o exótico poderia dar lugar a mais profundidade. A discussão sobre preconceito ganharia força num enfoque mais amplo. Mas o recado está dado: é preciso aprender a conviver com diferenças. Diferenças que são tantas que não se enquadram em visões binárias, de feminino e masculino.
DE GRAVATA E UNHA VERMELHA
DIREÇÃO Miriam Chnaiderman
PRODUÇÃO Brasil, 2014, 12 anos
QUANDO estreia nesta quinta (7)
AVALIAÇÃO bom ★
Livraria da Folha
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