Flertando com rock e samba, herdeiros de Gil se unem pelo reggae 'social'
Ricardo Borges/Folhapress | ||
Da esq. para a dir.: Francisco Gil, Magno Brito, Luthuli Ayodele, José Gil e João Gil |
O patrono da família Gil tem um legado que vai além de sua produção musical: Preta, Nara, Bem e, agora, José, João e Francisco compõem o vasto time de herdeiros que se arriscam na mesma carreira de Gilberto.
Juntos, o filho e os netos, respectivamente, do compositor são 60% da Sinara, banda de reggae pautada pela "positividade e o amor", como define o vocalista Luthuli Ayodele, 20, que ao lado do baixista Magno Brito, 24, forma a ala não-Gil do grupo.
O primeiro EP, "Sol" (batizado em homenagem a Sol de Maria, filha de Francisco, neta de Preta Gil e primeira bisneta de Gilberto), foi lançado em novembro, pela Sony.
Nele, os três meninos nascidos em berço de ouro cantam, entre outros temas, a favela —"A crua realidade vai sensibilizar você (...) / Favela sou eu / Favela é você", diz uma das faixas.
A referência é de Luthuli, que morou até os 8 anos na Rocinha, maior comunidade do país, e assina a maioria das composições.
"A favela não é só de quem vive nela. É também do cara que mora na cobertura da Vieira Souto [avenida mais nobre do Rio] porque quem limpa a privada dele é do morro", diz.
Foi na Rocinha que ele conheceu a mais jovem geração dos Gil. Seu pai, um dos fundadores de uma casa de cultura, era parceiro de Gil no projeto. Do contato com a família, nasceu a amizade com Francisco, 19, por causa da semelhança de idades.
Anos mais tarde, se reencontraram e decidiram montar a banda. Depois de uma epopeia para achar outros integrantes, sem sucesso, "chamei minha galera", conta o filho de Preta, guitarrista.
O choque de origens diferentes de Luthuli e Francisco acaba refletindo hoje nas músicas do grupo.
"As letras têm sempre uma preocupação social. Não chegam a ser denúncias, mas reflexões", explica o baterista José, 23, caçula de Gilberto e Flora Gil e irmão da também famosa Bela, cozinheira e apresentadora de TV.
A sonoridade tem pitadas de rock, rap e samba, uma espécie de "interseção" do que cada integrante gosta mais, explica o guitarrista João, 25.
'DEIXA O MENINO'
Gil, o pai e avô, só viu até hoje um show do grupo, em janeiro deste ano. Foi o primeiro a chegar, lembra Francisco. "No fim das contas, falou que ficou muito mais vaidoso de ver seus três meninos no palco do que orgulhoso."
O compositor, que desbravou o reggae nos anos 1970 e em 2002 gravou um CD com músicas do ídolo Bob Marley, não costuma dar palpites sobre a sonoridade da banda.
Uma frase, conta o neto, é recorrente em conversas a respeito da empreitada dos herdeiros: "Deixa o menino."
Foi assim também com Nara –primogênita que já gravou com o pai–, Bem –hoje guitarrista da banda Tono–, e Preta –que surgiu com seu primeiro disco em 2003 e amargou comparações com Gil. Hoje, ela arrasta multidões pelo país com o "Baile da Preta" e "Bloco da Preta". "Deixa a menina."
O peso da família ajuda, é claro. "É natural que as coisas que a gente faz ganhem certa dimensão", admite Francisco. "Mas, acima de tudo, pela competência."
Além de lançar o primeiro trabalho numa grande gravadora, a Sinara já tem na agenda participação em programa da Globo e música sua divulgada pela funkeira Anitta no Instagram. Gilberto também contribuiu emprestando seu estúdio pessoal para ensaios.
Mas o sobrenome não resolve tudo: "Para chamar público, sinceramente não ajudou muito. Nosso primeiro show, na rua e de graça, não tinha ninguém", lembra Luthuli. "Nós crescemos como qualquer outra banda, e até hoje somos como qualquer outra banda."
Também não é um fardo ou provoca medo de comparações. Eles não se importam de serem chamados como "os meninos de Gil". "A gente trata com naturalidade", diz Francisco. José completa: "Aceita que dói menos."
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