ANÁLISE
Sem exageros, maestro Kurt Masur era um mestre do contraponto
Hendrik Schmidt - 10.out.2014/Associated Press | ||
Regente alemão Kurt Masur em imagem de arquivo de 2014 |
Logo depois da queda do Muro de Berlim, o nome do maestro Kurt Masur —uma voz ativa e pacifista vinda da Alemanha Oriental— chegou a ser cogitado para presidir o futuro país unificado, mas ele preferiu assumir a Filarmônica de Nova York.
Para os amigos, o regente, morto neste sábado (19), aos 88 anos, optara pelo desafio mais difícil: depois de longo período comandada por Leonard Bernstein (1918-1990), a orquestra americana não havia se acertado nem com o francês Pierre Boulez nem com o indiano Zubin Mehta. O ambiente em Nova York também não era dos melhores, mas o fato é que a autoridade musical do alemão transformou em pouco tempo o som do grupo.
Críticos e público apontaram a evolução, e Masur se manteve como titular da orquestra entre 1991 e 2002. Em 2012, o maestro revelou que sofria de mal de Parkinson.
A notícia de sua morte foi dada pela própria direção da Filarmônica de Nova York, que criou especialmente para ele o cargo de diretor emérito após os 12 anos na casa. Foi também titular da Filarmônica de Londres (2000-2007) e diretor artístico da Orquestra Nacional da França (2002-2008). Como convidado regeu todas as grandes orquestras.
A proximidade com o maestro paulista Roberto Minczuk —que, ainda como trompista, havia atuado sob sua direção na Alemanha— resultou em uma relação importante com o Brasil: na primeira década do século 21, Masur regeu várias vezes a Osesp, a OSB e até mesmo a orquestra de bolsistas do Festival de Campos do Jordão.
O segredo da arte de Masur origina-se dos 26 anos de trabalho profundo e consistente como mestre de capela da orquestra Gewandhaus de Leipzig, cargo que assumiu em 1970 (ainda na Alemanha Oriental) e que manteve até 1996 (quando já estava em NY).
A orquestra é uma das mais antigas da Europa em atividade. Fundada em 1781, teve Mendelssohn (1809-47) como regente titular por 12 anos e foi o palco de estreias de Wagner (1813-83) e Brahms (1833-97) dirigidas pelos próprios compositores.
Com Masur, o grupo atingiu um nível de rara minúcia, especialmente em Brahms. Sem gestuais exagerados -e sempre sem batuta, como se fosse regente de coro- o maestro foi um mestre do contraponto.
Tratava os metais sem nenhuma histeria, compondo um som austero, como se tivesse uma fina camada de verniz a proteger as linhas sempre bem articuladas. Tudo sem efeitos: em sua música, não há nada gratuito.
Com a Gewandhaus, ele veio a São Paulo no fim dos anos 1980, quando ainda não era a figura midiática que haveria de se tornar. Quem esteve no teatro Cultura Artística nunca vai tirar da memória o "Adagio" da "Segunda" de Brahms.
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade