Crítica
Obra mistura-se à perplexidade diante dos fatos de nossos dias
O novo livro de José Luiz Passos não é um romance histórico sobre o marechal Floriano Peixoto (1839-1895), segundo presidente da República brasileira, nem tampouco uma biografia do político, algo improvável em apenas 200 páginas. Seria também arriscado oferecer uma sinopse do enredo como se fosse um romance realista.
Passos poderia ter escolhido fazer uma obra ensaística sobre a recursividade de certos padrões éticos na história do país. Mas não. Esse parece ser um livro nascido do desejo, mais do que contar uma história, de influir na História.
O romance intercala duas narrativas: a trajetória lacunar de Floriano e a história da cozinheira de família de classe média alta que testemunha uma das manifestações populares de 2013. Mas vai além.
Danilo Verpa/Folhapress | ||
O escritor José Luiz Passos, autor de 'O Marechal de Costas' |
A história de Floriano explora sua obsessão com a biografia de Bonaparte e a ideia de que "a gênese do passado está no presente, não o contrário". A história da cozinheira abre espaço para um professor que articula entendimentos sobre a situação atual e o passado político do país.
Muitos elementos para um livro tão curto. Não saímos dele com a sensação de conhecermos melhor o marechal que usurpou o poder constitucional, nem a história da República, nem a classe média, ou a situação da classe trabalhadora. Não há, ainda, compreensão da natureza das manifestações de rua ou do significado da deposição de Dilma. Desnecessário seria dizer, contudo, que esses não são defeitos do livro.
Isso porque, aos poucos, vamos nos relacionando com essas figuras "históricas" na chave livre da ficção. No romance, temos maior chance de experimentar conexões atemporais com os personagens num processo que nos humaniza em nossas baixezas e grandezas. Não há santos nem demônios na política brasileira ou nas revoltas das ruas, de hoje ou de ontem.
"O Marechal de Costas" mistura-se à nossa perplexidade diante dos fatos de nossos dias. Golpistas, como Floriano, ao contrário do que diz o grito, passaram, passam e continuarão a passar. Mas se conseguem se livrar da condenação do presente, não escapam da "pena da ignomínia, pena quase sem fim".
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