Crítica
Premiados solistas aliam virtuosismo a inteligência em CDs
Zanone Fraissat - 15.ago.16/Folhapress | ||
O pianista Cristian Budu no Teatro Franco Zampari em São Paulo |
Dois jovens solistas brasileiros –ambos vencedores de concursos internacionais de ponta– lançaram, em 2016, CDs que chamam atenção em um meio amiúde e carente de vida e energia.
São eles o violonista soteropolitano João Carlos Victor, nascido em 1985 (vencedor do Concurso Francisco Tárrega, na Espanha, em 2015) e o pianista Cristian Budu, nascido em Diadema (SP) em 1988, vencedor do Clara Haskil, na Suíça, em 2013.
Budu inverte as expectativas usuais para um programa que justapõe Chopin (1810-49) a Beethoven (1770-1827), ressaltando profundidade e heterogeneidade nos 24 "Prelúdios" op.28 do primeiro, e a graça fina e bem humorada das sete "Bagatelas" op. 33 do segundo.
Ele desvela camadas de pianíssimos, em um "blend" de timbres que percorre o fluxo temporal (como no enigmático "Prelúdio" n.2), o que se soma às escolhas das articulações (n.3), à delicadeza (n.15, com incrível entrada da segunda seção), e à clareza (n.8 e n.16).
Sua "Bagatela n.2" –com a linha de baixo querendo se mexer, nervosa, no meio da textura, pedindo para voltar à primeira parte– rememora o elo de Beethoven com Haydn (1732-1809), seu professor.
Victor, por outro lado, faz bom uso da diversidade estilística que o violão clássico conquistou para si a partir das gravações do concertista britânico Julian Bream.
A densidade e seriedade das fantasias do renascentista John Dowland (1563-1626) –colocadas no início, meio e fim do álbum– abrem espaço para uma obra contemporânea inédita ("Répéter", do também baiano Paulo Rios Filho) e qualificam o repertório canônico.
Ganham luz "Invocación y Danza", a mais especulativa obra do espanhol Joaquín Rodrigo (1901-99), trabalhada com pleno domínio estrutural e pesquisa sonora, e a "Sonata Homenagem a Boccherini" do italiano Castelnuovo-Tedesco (1895-1968), a cujo movimento final Victor imprime uma completa tradução do título "Vivo ed energico".
O andamento das mazurcas do catalão Francisco Tárrega (1852-1909) –em um bloco aberto pela "Barcarola" de Mendelssohn (1809-47)– é cuidadosamente planejado: há paralelismos e compensações, tanto em cada peça como na simetria complexa proposta pelo todo do CD.
Para além do brilho virtuosístico, os lançamentos de Budu e Victor reforçam que a inteligência pode ser um critério estético. Felizmente, não são casos isolados.
"Passion", CD de Fabio Martino –outro jovem pianista brasileiro em ascensão– e o pacote de violão da Guitarcoop –tendo à frente o magistral "The Romantic Guitar", de Fabio Zanon– mostram que, 50 anos após "Sargent Pepper's", dos Beatles, o conceito de álbum permanece central para a arte musical.
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