Stand-up de Jerry Seinfeld no clube onde ele começou estreia nesta terça

Crédito: Damon Winter/The New York Times O comediante Jerry Seinfeld em 2015
O comediante Jerry Seinfeld em 2015

SÉRGIO RIZZO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O primeiro episódio foi ao ar discretamente em 5 de julho de 1989 e o último, já com pompas globais, em 14 de maio de 1998. Mas "Seinfeld" só terminou para você, ingrato, pois continua viva em nossos corações.

E de certa forma reviverá também, a partir desta terça (19), na Netflix, com a estreia do especial "Jerry Before Seinfeld" (Jerry antes de Seinfeld), em que o comediante retorna a seus tempos de stand-up, e fala de sua vida e carreira no Comic Strip, em Nova York, onde ele começou.

O contrato, de US$ 100 milhões (cerca de R$ 312 milhões), inclui 24 novos episódios da série "Comedians in a Car Getting Coffee", mas (ainda) não os 173 episódios das nove temporadas de "Seinfeld", que foram lançados em DVD e continuam a ser reprisados por diversos canais.

Estima-se que Jerry Seinfeld tenha faturado cerca de US$ 400 milhões (cerca de R$ 1,25 bilhão) com a "sindicalização" da série (os dividendos por reprises). Sabia o que fazia, portanto, quando recusou oferta da rede NBC, de US$ 110 milhões (em 1998!) pela décima temporada.

Todos os 22 episódios da última temporada ocuparam o primeiro lugar no ranking de audiência dos EUA, proeza que só as lendárias "I Love Lucy" (em 1951) e "The Andy Griffith Show" (em 1960) haviam alcançado.

Com a fragmentação de alternativas de lazer, inclusive de filmes e séries, é difícil que se repita atualmente a capacidade que "Seinfeld" teve de fincar pé no cenário cultural dos anos 1990, no papel de objeto comentado e também de comentarista de outros objetos.

Mas é provável que a estreia desta terça na Netflix contribua para despertar novo interesse pelo Jerry que despontou nos anos 1990 como ícone do humor na TV americana.

Quem não havia nascido em 1999 ou ainda era criança será capaz de apreciar as aventuras de Jerry (Jerry Seinfeld), Elaine (Julia Louis-Dreyfus), Kramer (Michael Richards) e George (Jason Alexander)?

Há alguns pré-requisitos incontornáveis. Em primeiro lugar, é preciso ter alguma paciência. A exemplo de outros sucessos, os personagens e as situações só engrenam a partir da segunda ou da terceira temporada.

As últimas são as melhores; a série foi interrompida no auge, e não por esvaziamento. A forma estava consagrada e bastaria atirar nela qualquer tema da agenda sociopolítica (apropriação cultural seria um exemplo para hoje).

A "série sobre nada", como ficou conhecida, era na verdade sobre tudo. Na dramaturgia criada por Jerry Seinfeld e Larry David, a abordagem de qualquer tema rendia comentários impagáveis sobre a sociedade urbana contemporânea.

O que nos leva a um segundo pré-requisito: estar aberto a um humor politicamente incorreto, orquestrado por personagens às vezes desprezíveis em seu olhar para o mundo e seu comportamento com os outros.

Nenhum dos protagonistas –com uma leve concessão à maluquice de Kramer– vale que se ponha a mão no fogo por eles. Mas o atual sucesso de "Veep", com Julia Louis-Dreyfus, sugere que há um público jovem que curte essa pegada cínica. O próprio Seinfeld testará essa hipótese a partir de hoje.

WOODY ALLEN

Nascido em Nova York e descendente de imigrantes judeus da Europa oriental, como Woody Allen, Jerry Seinfeld, 63, também deu início à carreira de "performer" em clubes de stand-up.

Ambos pertencem a uma tradição que se enraizou na cultura popular americana na primeira metade dos anos 1940. O conturbado cenário sociopolítico funcionou como fermento. Era preciso ter válvulas de escape.

Desde então, gerações de espectadores foram habituadas a uma experiência social que não se confunde com o humor teatral, e que lida com a palavra a partir de princípios bem particulares de cadência, interatividade e combinação ator-personagem.

Além de bares, casas noturnas e cabarés, as apresentações de stand-up chegaram a ocupar salas de cinema, precedendo a exibição de filmes. "Bíblias" (compêndios) de piadas passaram a ser publicadas.

As duas principais vertentes foram consolidadas por Henny Youngman (1906-1998) e Milton Berle (1908-2002). Sempre acompanhado de um violino, Youngman celebrizou-se como "o rei dos one-liners".

Seu estilo consistia em piadas curtas, de uma ou duas frases, criando um ritmo intenso. Exemplo: "Meu pai era o bêbado da cidade. Em geral isso não é tão ruim, mas em Nova York?". E outra, e outra, e outra.

Berle formatou o modo mais tradicional, costurando piadas curtas a comentários e observações ao longo da apresentação. Admitia ser "The Thief of Badgag", trocadilho com "O Ladrão de Bagdá" e "bad gag", piada ruim. Era um mestre em se aproveitar delas para virar o jogo.

Allen –que fazia números de mágica na adolescência, mas que subiu ao palco pela primeira vez para um stand-up em 1960– esteve mais próximo da tradição iniciada por Berle. Seinfeld –que teve sua primeira noite amadora como stand-up em 1976 – estabeleceu-se como um "herdeiro" de Allen quando a carreira como diretor, roteirista e ator de cinema o absorveu.

JERRY BEFORE SEINFELD

QUANDO disponível a partir desta terça (19), na Netflix

POR ONDE ANDAM
O que faz ou já fez a turma de 'Seinfeld'

JERRY SEINFELD

O ator que fez George Costanza segue no ofício. Sua tentativa de voo solo, com "Bob Paterson", durou uma temporada. Foi também protagonista de "Listen Up" e reencontrou os amigos em "The New Adventures of Old Christine", "Curb Your Enthusiasm" e "Comedians in a Car Getting Coffee"

LARRY DAVID

Crédito: Divulgação O comediante Larry David em cena da série 'Curb Your Enthusiasm
O comediante Larry David em cena da série 'Curb Your Enthusiasm'

Saiu de trás das câmeras para protagonizar "Curb Your Enthusiasm", em sua nona temporada na HBO. Fez participações em outras séries, como "Saturday Night Live", "Entourage" e "Hannah Montana". Também protagonizou o longa "Tudo Pode Dar Certo" (2009), de Woody Allen

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