MoMA une peças de grifes a itens banais e inquire sobre papel da moda
Pendurada sozinha numa das paredes do MoMA, uma blusa vermelha com capuz lembra um sudário.
A peça da marca Champion, das mais banais e populares entre jovens da periferia das cidades americanas, responde pelo lado não espetacular —e político— de uma exposição de moda no museu nova-iorquino.
Na ressaca da onda de violência policial que matou uma série de jovens negros nos Estados Unidos, casacos como esse deixaram de ser uma roupa qualquer e viraram símbolo de resistência.
É nesse poder da vestimenta de resumir uma época ou de se tornar monumento que parece estar calcada a maior mostra dedicada às roupas no MoMA em sete décadas.
Isso explica a justaposição um tanto conflitante de peças como a blusa com capuz e clássicos vestidinhos pretos, entre eles criações da Chanel e da Dior, sandálias Havaianas, cuequinhas brancas Calvin Klein e as roupas cheias de calombos que a estilista Rei Kawakubo criou para a sua grife Comme des Garçons no final dos anos 1990.
HYPE
Essa seleção de itens incontornáveis na história da moda respira um ar despojado, valorizando o poder do design sobre o fetiche associado às roupas.
Às vezes, porém, escancara que a relevância de uma peça tem menos a ver com pensamento estético e mais com a força do marketing e do hype em torno dela. Talvez porque a história não seja tão simples quanto faz parecer a longa —e austera— lista de todos os 111 itens da mostra na entrada das galerias.
Enumeradas ali, as peças parecem ter o mesmo peso, celebradas pela influência que exerceram ao longo dos anos, mas também rebaixadas a um simples número.
Enquanto neutraliza o poder de deslumbramento de algumas roupas, como a mítica bolsa Birkin da Hermès, saltos usados por Elton John e um macacão da era espacial que já vestiu David Bowie, a mostra eleva à condição de peça de museu coisas como máscaras cirúrgicas usadas nas ruas de Tóquio, camisas polo, biquínis e até pochetes.
Isso está longe de ser um problema e casa com a tradição do MoMA de reconhecer como parte da história aquilo que outros museus vão pensar só depois em incorporar a seus acervos de design.
Mas outra reflexão que fica é até que ponto instituições museológicas não estão se deixando levar pela lógica do mundo corporativo, nesse caso a do fast fashion.
Quase tudo na exposição está à venda na loja à saída do museu e em outras butiques espalhadas pela cidade.
No fundo, tudo que é moda dentro das galerias do museu pode virar lucro do lado de fora, da blusa com capuz à camisetinha branca imortalizada por James Dean, o que esvazia qualquer traço de caráter político dessa mostra.
VÉU HI-TECH
Fora as peças mais emblemáticas ali, o esforço de extrair contestação ativista das roupas resulta um tanto anêmico, mas lá estão também outras criações recentes da moda global que refletem como a indústria do vestuário não pode ignorar um planeta de fronteiras mais diluídas.
Nessa corrente, estão itens como uma versão hi-tech do véu muçulmano, peça da Uniqlo, o burkini, mistura de biquíni com burca, item quase obrigatório nas praias do Oriente Médio, e famosos "zoot suits", os ternos larguíssimos usados por negros do Harlem na década de 1940.
Um ponto de equilíbrio na exposição vem desse mesmo bairro nova-iorquino.
Numa das alas mais fortes da mostra, estão as criações de Dapper Dan, um estilista negro que recriou com retalhos encontrados na vizinhança clássicos da Gucci e da Louis Vuitton até ser contratado por essas grifes, provando que a moda, como quer o MoMA, é uma via de mão dupla entre lucro e vida.
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