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28/06/2012 - 11h00

Alan Turing: a vida curta e brilhante e a morte trágica de um enigma

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MAEV KENNEDY
DO "GUARDIAN"

Uma máquina de codificação alemã Enigma emprestada por Mick Jagger e um computador de 1950 que tem menos poder de cálculo do que um smartphone, mas que um dia foi o mais rápido do mundo, estão entre os principais artefatos da exposição que o Museu de Ciência de Londres dedica à vida curta brilhante do cientista Alan Turing e à sua morte trágica.

"Estamos no paraíso dos 'geeks'", disse sir John Turing, sobrinho do matemático, em meio às peças de história da computação, que são como relíquias sagradas para os admiradores de Turing, entre os quais uma tartaruga mecânica controlada por computador que encantou o cientista no Festival da Grã-Bretanha, em 1951. "A exposição é um grande tributo a um homem notável", diz John Turing.

Divulgação
Matemático Alan Turing, que sofreu castração química na primeira metade dos anos 1950, por ser homossexual
Matemático Alan Turing, que sofreu castração química na primeira metade dos anos 1950, por ser homossexual

"Meu pai o encarava com imensa admiração, e na família era comum usar a palavra 'gênio' quando falávamos dele", diz. "Mas meu pai também falava de sua excentricidade, de como ele ia de bicicleta ao trabalho em Bletchey Park usando uma máscara contra gás, para controlar suas alergias; os pedestre com quem ele cruzava se assustavam, achando que um ataque com gás era iminente".

A exposição, que celebra o centenário de nascimento de Turing, trata tanto de sua traumática vida pessoal quanto das brilhantes realizações científicas de um homem que foi um dos membros-chave da equipe que decifrava códigos de Bletchley Park, e criou o Teste de Turing, que continua a ser usado para avaliar a inteligência artificial.

Turing era gay, e em 1952, quando trabalhava na Universidade de Manchester, onde tinha um relacionamento com um técnico chamado Arnold Murray, foi detido e acusado de obscenidade grave. Só escapou à prisão porque aceitou passar por um processo de castração química, envolvendo um ano de aplicação de estrógeno, algo que o curador David Rooney afirma ter causado efeitos devastadores sobre ele, física e mentalmente.

Em 1954, Turing foi encontrado morto em sua cama, e na mesa de cabeceira ao seu lado havia uma maçã meio comida; reza a lenda que ele se suicidou injetando cianeto na fruta.

A mãe do matemático insistiu em que ele havia morrido por acidente, como resultado de falhas em uma experiência que conduziu para criar uma colher folheada em prata. Turing anteriormente havia criado outro talher folheado a ouro, extraindo ouro de um relógio de bolso. Os produtos químicos usados na experiência foram encontrados em uma panela no fogão.

Mas o relatório do legista, que também está na exposição, é claro: Turing havia consumido o equivalente a um cálice de vinho de veneno, e o formulário de autópsia registra sombriamente que "seu cérebro cheirava a amêndoas amargas".

Há muitas teorias de conspiração sobre sua morte, mas a explicação de Rooney para a maçã é pragmática: não se tratava de uma obsessão com a maçã envenenada da versão de Walt Disney para "Branca de Neve", como há quem alegue, mas da solução de um homem muito inteligente para rebater o sabor horrível do cianeto.

O sobrinho de Turing disse que o processo contra ele e sua morte foram devastadores para a família, mas que eles haviam ficado muito satisfeitos com o pedido público de desculpas apresentado em 2009 pelo então primeiro-ministro Gordon Brown.

A campanha por um perdão póstumo é mais problemática, diz ele, falando em sua condição de sócio do escritório de advocacia Clifford Chance.

Divulgação
Estátua de Alan Turing no museu de Bletchley Park, na Inglaterra; governo pede perdão por tratamento "chocante"
Estátua de Alan Turing no museu de Bletchley Park, na Inglaterra; governo pede perdão por tratamento "chocante"

"Muita gente foi condenada de maneira correta sob os termos da lei então vigente, por delitos que hoje encaramos de modo muito diferente. Não seria correto que Turing recebesse um perdão só porque é um homem famoso; isso seria ir longe demais. Mas a sugestão de que pode haver alguma reparação pelo uso de sua imagem em uma cédula de libra --isso seria uma boa reparação", afirma.

GÊNIO

A exposição inclui as únicas peças sobreviventes de uma das 200 "bombes", as máquinas que operavam dia e noite para decodificar mensagens alemãs em diversos locais do Reino Unido; cada uma delas pesava uma tonelada e todas foram vendidas como sucata depois da guerra.

Os componentes foram emprestadas pelo centro de inteligência do governo no GHCQ (Government Communications Headquarters), o serviço de comunicações e códigos do governo britânico, o que exigiu complicadas negociações.

Ainda que os visitantes possam não perceber, uma curta entrevista filmada nas instalações do GCHQ é ainda mais excepcional: são as únicas imagens filmadas no complexo de Cheltenham que já foram liberadas para exposição pública.

Em 1950, quando o computador Pilot Ace, para cujo desenvolvimento Turing foi um colaborador fundamental, estava enfim operando no Laboratório Nacional de Física britânico, ele já se havia transferido a Manchester, impaciente diante da lentidão do trabalho do setor público no pós-guerra.

A máquina está exposta ao lado de uma chapa metálica amassada, parte da fuselagem de um Comet, o primeiro jato civil de passageiros, que explodiu sobre o Mediterrâneo matando todos os passageiros e tripulantes. O computador executou os milhões de cálculos necessários a descobrir o motivo do acidente.

Rooney diz que a exposição também pretende destruir a impressão de que Turing era um cientista solitário; inclui imagens de muitas das pessoas com quem trabalhou, todas as quais o encaravam com admiração e afeto.

Quando ele foi ao laboratório ver as tartarugas robotizadas, em 1951 --elas respondiam a comandos de luz e corriam de volta para suas tocas quanto uma lâmpada se acendia em seu interior--, Turing conseguiu decifrar os códigos de um computador de jogo criado por um aluno cujo trabalho ele reconheceu. O matemático decifrou o algoritmo da máquina na hora, e o usou para levar o computador a enviar mensagens simultâneas de "você ganhou" e "você perdeu", e depois fazê-lo travar aborrecido.

Em entrevista gravada para a mostra, seu último pesquisador, o professor Bernard Richards, da Universidade de Manchester, com quem Turing tinha uma reunião marcada no dia em que morreu, diz: "Turing para mim era um gênio, um homem que operava em um plano mais elevado".

"Codebreaker: Alan Turing's Life and Legacy", fica no Museu de Ciência de Londres até junho de 2013. A entrada é grátis.

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

 

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