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03/08/2012 - 14h00

Estudo sobre mudanças climáticas pretende fazer céticos mudarem de ideia

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LEO HICKMAN
DO "GUARDIAN"

A superfície da Terra ficou 1,5ºC mais quente nos últimos 250 anos e o aumento de temperatura se deve quase inteiramente ao homem, revela um estudo científico. O estudo foi feito para analisar as dúvidas dos céticos climáticos que questionam a afirmação de que o aquecimento global induzido pelo homem está ocorrendo.

Bob Strong/Reuters
Iceberg flutua perto na Groenlândia; temperatura global sobe desde o século 19 e aquecimenoo acelera
Iceberg flutua perto na Groenlândia; temperatura global sobe desde o século 19 e aquecimenoo acelera

O professor Richard Muller, físico e cético das mudanças climáticas que fundou o projeto Berkeley da Temperatura da Superfície Terrestre (Best, na sigla em inglês), disse ter ficado surpreso com as descobertas.

"Não esperávamos isso, mas, como cientistas, é nosso dever deixar que as evidências mudem nossas opiniões." Ele acrescentou que agora se considera um "cético convertido" e que suas opiniões sofreram uma "reviravolta total" em um prazo curto de tempo.

"Nossos resultados mostram que a temperatura média da superfície da Terra subiu 2,5ºF nos últimos 250 anos, incluindo uma elevação de 1,5ºC ao longo dos últimos 50 anos. Ademais, parece provável que toda essa elevação tenha resultado por causa das emissões humanas de gases estufa", escreveu Muller em artigo para o "New York Times".

A equipe de cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley colheu e fundiu 1,4 milhão de observações de temperatura terrestre de 44.455 locais em todo o mundo, datadas de a partir de 1753.

Os conjuntos anteriores de dados criados pela Nasa, a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA, o Escritório Meteorológico britânico e a unidade de pesquisas climáticas da Universidade de East Anglia vinham desde apenas meados do século 19 e eram baseados em um quinto da quantidade de registros de estações meteorológicas.

O financiamento do projeto incluiu US$ 150 mil da Fundação Beneficente Charles G. Koch, criada pelo bilionário magnata americano do carvão Charles Koch, que é um dos apoiadores principais do "think tank" Instituto Heartland, cético das mudanças climáticas. A pesquisa também recebeu US$ 100 mil do Fundo para Pesquisas Climáticas e Energéticas Inovadoras, criado por Bill Gates.

Diferentemente de esforços anteriores, os dados de temperatura obtidos de fontes diversos não foram homogeneizados à mão, algo que tinha suscitado uma das críticas principais dos céticos climáticos. Ao invés disso, a análise estatística foi "completamente automatizada para reduzir o viés humano". A equipe do Best concluiu que, apesar de sua análise mais profunda, suas conclusões corresponderam de perto às reconstruções anteriores da temperatura, "só que com incerteza reduzida".

Em outubro passado a equipe do Best publicou resultados indicando que temperatura terrestre global média subiu cerca de 1ºC desde meados da década de 1950. Mas a equipe não procurou possíveis impressões digitais que explicassem esse aquecimento.

A análise mais recente chegou a um passado muito mais distante, mas, crucialmente, também procurou a mais provável causa da elevação da temperatura. Ela analisou o impacto aquecedor da atividade solar --uma teoria popular entre os céticos climáticos--, mas constatou que, nos últimos 250 anos, a contribuição do Sol tem "correspondido a zero".

Constatou-se que erupções vulcânicas provocaram quedas curtas na alta da temperatura no período de 1750-1850, mas "apenas análogos fracos" no século 20.

"Para minha grande surpresa, de longe a melhor correspondência foi com o registro do dióxido carbônico atmosférico, medido em amostras atmosféricas e em ar preso no gelo polar", disse Muller. "Embora isto não comprove que o aquecimento global seja causado por gases estufa emitidos pelo homem, neste momento essa é a melhor explicação que encontramos. Outras teorias alternativas terão que superar esta explicação."

"TRANSPARÊNCIA TOTAL"

Muller disse que as conclusões de sua equipe vão mais longe e são mais fundamentadas que o relatório mais recente lançado pelo Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas.

Numa iniciativa não convencional que visa apaziguar os céticos climáticos, pelo fato de permitir "transparência total", os resultados foram divulgados publicamente pelo "Journal of Geophysical Research" antes de serem submetidos a uma revisão por pares.

Todos os dados e análises se encontram no site da Best, onde podem ser estudados livremente. Isso segue o padrão adotado por resultados anteriores obtidos pelo Best, nenhum dos quais até agora foi publicado em periódicos submetidos a revisão por pares.

Quando o projeto Best foi anunciado, no ano passado, o conhecido blogueiro cético climático Anthony Watts foi consultado sobre a metodologia. Ele declarou na época: "Estou disposto a aceitar qualquer resultado que eles produzirem, mesmo que ele desminta minhas premissas". Desde então, contudo, surgiram tensões entre Watts e Muller.

Os primeiros indicativos sugerem que é pouco provável que os céticos climáticos aceitem plenamente os resultados mais recentes do Best. A professora Judith Curry, climatologista do Instituto Georgia de Tecnologia, diretora de um blog popular entre céticos climáticos e membro consultivo da equipe Best, disse ao "Guardian" que o método usado para atribuir o aquecimento às emissões humanas foi "simplista e nada convincente, em minha opinião".

Ela acrescentou: "Não creio que esta pergunta possa ser respondida com as curvas simples usadas neste artigo, e não creio que o artigo acrescente qualquer coisa à nossa compreensão das causas do aquecimento recente".

"BASTÃO DE HÓQUEI"

O professor Michael Mann, paleoclimatologista da Universidade Penn State que vem enfrentando hostilidade de céticos climáticos por seu famoso gráfico do "bastão de hóquei", mostrando uma elevação rápida das temperaturas no século 20, disse que saúda os resultados do Best, já que "demonstram de novo algo que os cientistas sabem com algum grau de certeza há quase duas décadas".

Ele acrescentou: "Aplaudo Muller e seus colegas por agirem como agiria qualquer cientista digno, seguindo o rumo indicado por suas análises, sem levar em conta possíveis repercussões políticas. Em função do que descobriram, eles certamente serão criticados pela turma dos negadores profissionais das mudanças climáticas."

Muller disse que a análise de sua equipe sugere que a temperatura da superfície terrestre vai subir 1,5ºC nos próximos 50 anos, mas que, se a China continuar com seu crescimento econômico acelerado e seu consumo enorme de carvão, o mesmo aquecimento poderá ocorrer em menos de 20 anos.

"A ciência é aquele campo estreito de conhecimento que, em princípio, é universalmente aceito", escreveu Muller. "Iniciei esta análise para encontrar respostas a perguntas que, a meu ver, não tinham sido respondidas ainda", disse.

"Espero que a análise Berkeley Earth ajude a resolver as divergências científicas com relação ao aquecimento global e suas causas humanas. A parte difícil virá em seguida: chegar a um acordo, envolvendo todo o espectro político e diplomático, sobre o que pode e deve ser feito."

Tradução de CLARA ALLAIN.

 

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