Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
12/08/2012 - 08h00

O progresso dos economistas

Publicidade

MICHIKO KAKUTANI
DO "NEW YORK TIMES"

Da maneira que Sylvia Nasar a relata, a história da "lúgubre ciência" da economia parece luminosa, uma trajetória de ascensão e progresso constante. Pouco importa que Irving Fisher e John Maynard Keynes, duas das figuras centrais do livro, tenham sido apanhados de surpresa pela grande quebra de 1929.

Pouco importa que as lições da Grande Depressão e os alertas de alguns economistas prescientes tenham sido ignorados por Wall Street nos últimos anos, resultando em mais uma quebra apavorante, em 2008, e em problemas fiscais persistentes.

Na interpretação de Nasar, a história da economia ao longo dos últimos 150 anos envolve grandes pensadores responsáveis por desenvolver ferramentas de análise e ideias que permitiram à humanidade dominar, ao menos em alguma medida, as condições de miséria e carestia que no passado eram vistas como imutáveis e "completamente além do controle ou influência humanos".

"Calamidades econômicas --pânicos financeiros, hiperinflações, depressões, conflitos sociais e guerras-- continuam a provocar crises de confiança, mas não chegaram nem perto de eliminar os ganhos cumulativos na condição média de vida", ela escreve.

Depois da Segunda Guerra Mundial, prossegue Nasar, "o crescimento foi retomado e os padrões de vida dispararam", e "a História passou a ser dominada pela fuga de proporção cada vez maior da população mundial à pobreza abjeta".

Em "A Imaginação Econômica", Nasar diz que o objetivo é contar essa história por meio das vidas de "protagonistas que foram instrumentais para a transformação da economia em um instrumento de domínio".

Infelizmente, a seleção dos protagonistas de seu desordenado livro é tão arbitrária --ela diz ter escolhido economistas "de cabeça fria mas coração quente", cujos "temperamentos, experiência e gênio os levaram, em resposta a seus tempos e lugares, a fazer novas perguntas e encontrar novas respostas"-- que ela não consegue oferecer ao leitor uma compreensão estruturada de como o moderno pensamento econômico se desenvolveu, ou de como suas principais escolas se saíram à luz dos diferentes desdobramentos políticos e fiscais.

Nasar dedica grande espaço a discutir Keynes e seus discípulos, por exemplo, mas não oferece contexto completo sobre suas posições. Não há grande discussão sobre Adam Smith e sua filosofia do "laissez faire", que oferece tão forte contraste com a crença de Keynes na necessidade de intervenções do governo.

E embora os dias iniciais de Milton Friedman como adepto de Keynes e partidário do "new deal" sejam mencionados, não há exame real de como ele evoluiu para se tornar em influente defensor do livre mercado.

O que Nasar faz de maneira brilhante em seu trabalho --da mesma maneira que havia feito em "Uma Mente Brilhante", sua absorvente biografia do matemático John Forbes Nash Jr., publicada em 1998-- é nos oferecer retratos íntimos de seus temas, descobrindo de que maneira suas experiências pessoais influenciaram seu pensamento.

Nasar --ex-correspondente de economia do "New York Times" e agora professora de jornalismo na Universidade Colúmbia-- escreve com facilidade e autoridade sobre questões econômicas complicadas, mas demonstra ainda mais fluência ao evocar as vidas pessoais dos economistas que lhe servem de tema e os mundos sociais em que eles transitavam.

Nasar nos mostra a Viena da Belle Époque --encantada com a modernidade e desafiando Londres na corrida pela eletrificação e pela instalação de serviços telefônicos, fábricas modernas e bondes elétricos-- e em seguida um retrato devastador de Viena no final da Primeira Guerra Mundial, com veteranos de guerra rondando restaurantes à espera de sobras e membros desesperados da classe média, cujo patrimônio havia sido destruído pela inflação, trocando um piano por um saco de farinha, uma corrente de relógio de ouro por alguns sacos de batatas.

COLÔNIA DE FÉRIAS

Ela conjura o instigante mundo intelectual de Cambridge nos anos 30, quando os discípulos de Keynes o circundavam como planetas em torno do Sol, e captura o clima de intriga que cercava a Conferência de Bretton Woods, em 1944, que criou uma estrutura intervencionista mundial centrada no Banco Mundial e no FMI.

Ela descreve Bretton Woods como uma "colônia de férias ligeiramente decadente" em New Hampshire à qual acorreram 730 delegados de 44 países aliados, e "repleta de espiões".

Ao longo do livro, o leitor recebe uma vaga impressão de como os horrores da Primeira Guerra Mundial, da Depressão e da Segunda Guerra Mundial ensinaram aos economistas lições práticas sobre o funcionamento da política fiscal e o relacionamento entre os países.

As grandes inovações dos anos 20 e 30 ensinaram que "o que era bom para um país podia facilmente ser ruim para todos". "Desvalorizar a moeda, criar barreiras ao comércio e controlar os fluxos de capital eram formas efetivas de reduzir deficit no balanço de pagamentos, impedir a fuga de ouro e ampliar a arrecadação do governo", escreve Nasar. "Mas se todos adotassem as mesmas táticas, o resultado final seria empobrecimento e desemprego".

Quando chegou a Conferência de Bretton Woods, afirma Nasar, o keynesianismo havia sido aceito em todo o mundo, em certa medida; era "em geral reconhecido que manter a livre empresa em funcionamento em todo o mundo requeria interferência visível do governo".

Por conta de sua estrutura discursiva e desorganizada, "A Imaginação Econômica" deveria ser lido não como um guia sobre a emergência da economia moderna, mas sim como uma espécie de "Vidas Seletas dos Grandes Economistas".

Nasar nos apresenta Alfred Marshall, cuja metamorfose pessoal de aluno pobre beneficiado por bolsa de estudos a professor em Cambridge deu forma ao "seu otimismo quanto à improbabilidade do homem e de suas circunstâncias"; Irving Fisher, economista da Universidade Yale que alegava que "a ação individual jamais poderia dar origem a um sistema de parques municipais ou mesmo a um sistema útil de ruas"; e Beatrice Webb, sobre quem Nasar escreve que "ninguém merece mais que ela o crédito pela invenção da ideia de uma rede de segurança oferecida pelo governo --de fato, o moderno Estado previdenciário".

Entre os retratos mais atraentes que o volume apresenta está o de Joseph Alois Schumpeter, o brilhante economista europeu que argumentava que o traço distintivo do capitalismo era "a inovação incessante"--um "permanente maremoto de destruição criativa"-- e que identificou o empreendedor como visionário capaz de "revolucionar os padrões de produção ao explorar uma invenção" ou "uma possibilidade tecnológica não testada".

Ainda que Nasar trabalhe de modo conciso para explicar o que os diversos economistas que escolheu como tema pensavam sobre o papel que o governo deveria desempenhar na regulamentação dos mercados --bem como sobre suas ideias quanto às causas e possíveis soluções para problemas como o desemprego e inflação--, ela pouco faz para mostrar ao leitor de que maneira as teorias desses economistas poderiam ajudar a explicar as atuais dificuldades econômicas dos EUA e da Europa: mais uma decepção nesse trabalho desordenado, ainda que ocasionalmente inspirado, de uma autora imensamente talentosa.

Tradução de PAULO MIGLIACCI.

 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página