Minha história: Para fugir da crise, fazendeira cria delivery de laranjas
Do confisco da poupança por Fernando Collor em 1990 à crise global de 2008, passando pela atual recessão técnica enfrentada pelo Brasil e pela bolha da internet que estourou em 2000, seis pequenos empresários de diversos setores contam como enfrentaram seus momentos mais difíceis, o que aprenderam e quais os seus maiores arrependimentos.
*
Alessandra Sodré, 32, proprietária com seu pai de uma fazenda tradicional de Sorocaba, encontrou no delivery on-line de laranjas uma forma de compensar a queda da demanda pela fruta da indústria produtora de suco –e, de quebra, um jeito de ficar mais perto dos seus filhos pequenos.
Moacyr Lopes Junior/Folhapress | ||
A produtora de laranjas Alessandra Sodré, na sua fazenda |
Em depoimento à Folha, ela conta sua história.
*
Temos a fazenda São Pedro em Sorocaba há mais de 40 anos. Hoje, ela é administrada por mim e pelo meu pai.
Eu nunca pensei em trabalhar na fazenda. Sou formada em direito, advogava. Eu casei assim que me formei e engravidei poucos meses depois. Após a gravidez, percebi que um dos meus maiores valores na vida é ser mãe.
Eu queria poder dar atenção e cuidar dos meus filhos. Como advogada, não era fácil.
Isso coincidiu com uma crise no setor de laranja. De 2008 a 2012, por causa da crise internacional, os Estados Unidos pararam de comprar suco de laranja do Brasil. Com isso, a indústria não tinha para quem vender.
A Cutrale era uma das nossas maiores compradoras, mas o que eles iam fazer com aquelas laranjas todas que já tinham? Eles não compravam mais. Todo mundo estava sendo prejudicado.
Eu fui para a fazenda um fim de semana, como eu sempre fazia, e estava caminhando pelo pomar quando vi toneladas de laranjas ao chão.
Mesmo quando uma laranja não é vendida, ela é colhida e atirada ao chão, para servir de adubo natural. Mas isso tinha um custo. Eu fiquei intrigada com aquilo e fiquei pensando em algo para fazer com aquela laranja. É um absurdo jogar comida no lixo, não?
Eu resolvi postar no meu Facebook um textinho falando que eu vendia laranjas recém-colhidas, fresquinhas, em um saco de 27 quilos a R$ 35. Na primeira divulgação, já recebi 20 pedidos.
Comecei a vender também na porta do colégio dos meus filhos, para as mães dos amiguinhos. O Laranjas Online foi começando assim, de maneira casual.
Hoje, dois anos depois, temos um site, que é um delivery de laranja. Para nossa família foi ótimo porque, para o consumidor final, conseguimos vender por um valor mais alto –os pacotes que vendem mais são justamente os menores, de 5 kg e 10 kg.
Além disso, conseguimos atingir outros públicos, como pequenos comerciantes. Ainda vendemos para a indústria, mas cada vez menos.
O maior desafio foi a logística. Isso, em São Paulo, é muito complicado, então tive que delimitar a cidade no começo. Meus filhos estudavam um no Morumbi e outro no Jardim Paulistano. No início, como eu mesma entregava as laranjas, depois de deixar meus filhos na escola, usando o porta-malas do meu carro, eu me limitava aos bairros vizinhos.
No começo, meu pai não entendia muito bem. Ele falava que eu estava ficando louca. Quem vai vender laranja, e só laranja, pela internet? Mas descobrimos que existia demanda. Até porque laranja é algo chato de carregar até em casa.
Assim, com o tempo, fomos ampliando a região de entrega, atingindo a boa parte das regiões central, oeste e sul de São Paulo. Hoje, a laranja vai de caminhão.
Atualmente, na fazenda, eu cuido da parte comercial, e meu pai cuida da indústria e do tratamento da laranja. Minha rotina atual me possibilita ficar muito mais tempo perto dos meus filhos do que como advogada. O Antônio está com cinco anos. A Carolina, com três.
A gente pensa em atender outras regiões, mas às vezes é melhor manter uma escala menor, pela qualidade. É um trabalho gostoso, porque tem um lado de educar o cliente, mostrar que há vários tipos de laranjas além da pera, que é a que todos conhecem do mercado. Tenho um carinho muito grande pelas laranjas.
*
O QUE LEVOU À CRISE
A crise de 2008, que levou o sistema bancário global à beira do colapso quando ficou evidente que muitos títulos atrelados ao mercado imobiliário americano eram podres, causou forte queda da atividade econômica e do consumo no mundo. Isso reduziu a demanda por produtos que o Brasil exportava, como o suco de laranja, cujo grande mercado é o dos EUA, e chegou ao pequeno produtor que fornecia às indústrias do setor.
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade
Calculadoras
O Brasil que dá certo
s.o.s. consumidor
folhainvest
Indicadores
Atualizado em 24/04/2024 | Fonte: CMA | ||
Bovespa | -0,32% | 124.741 | (17h34) |
Dolar Com. | +0,38% | R$ 5,1487 | (17h00) |
Euro | -0,14% | R$ 5,5142 | (17h31) |