Deflação, e não inflação, é o principal problema na Europa e nos EUA
Enquanto no Brasil se discute o que é possível fazer para conter a alta de preços, em países da Europa e também nos Estados Unidos o que assusta os governos é o problema oposto: a deflação.
Ainda se recuperando dos efeitos da crise de 2008, eles tentam reverter a tendência de queda nos preços que, além de ser um sintoma do desempenho fraco, pode contribuir, no longo prazo, para piorar a situação econômica.
Nos 12 meses encerrados em setembro, a inflação norte-americana não variou, fechando o período em 0%.
Na zona do euro, os preços tiveram queda de 0,1%. Países da região mais prejudicados pela recessão, como Espanha e Grécia, sofrem ainda mais com a desvalorização (veja mapa nesta página).
"A deflação é um problema muito mais grave do que a inflação", afirma Clemens Nunes, professor de economia da FGV. A redução de preços faz com que os consumidores adiem compras, na expectativa de que, no futuro, seu dinheiro renda mais.
Como consequência, cai a demanda, o que derruba a receita das empresas, que deixam de investir e contratar.
O passo seguinte é o aumento do desemprego e cortes nos salários, que prejudicam ainda mais a economia.
Além disso, a deflação torna mais difícil o pagamento de dívidas, já que a renda diminuiu, mas o valor a pagar permanece o mesmo —diminuindo a busca por crédito.
Por isso, grandes bancos centrais defendem a meta mínima de 2% de inflação anual, sob o argumento de que uma leve alta de preços contribui para o crescimento da economia. No Brasil, o piso da meta é de 2,5%.
MEDIDAS
Os problemas enfrentados pelo Japão são o exemplo mais atual das consequências da deflação. Há duas décadas, o país busca saída para o cenário de recessão e queda de preços em que mergulhou após uma crise nos anos 1990. É o chamado processo deflacionário crônico.
Nos casos de EUA e Europa, o cenário é outro. Nesses países, a atuação dos bancos centrais pretende evitar que a situação de queda de custos, para a qual contribui também a redução nos preços das commodities, se prolongue.
Para fazer isso, o Fed (Federal Reserve, o BC americano) reduziu, a partir de 2008, a taxa de juros da economia dos EUA para um nível próximo de zero e realizou até o fim de 2014 um amplo programa de recompra de títulos para injetar recursos na economia e estimular o crescimento da atividade.
O BCE (BC europeu) segue o mesmo caminho e conduz, atualmente, um programa de compra de € 1,1 trilhão (R$ 4,9 trilhões) em títulos, além de manter os juros baixos.
As atuações, porém, têm resultados distintos. Enquanto a economia norte-americana, mais dinâmica, já voltou a crescer e têm registrado queda no desemprego, a zona do euro ainda sofre para melhorar o desempenho econômico. Por isso, enquanto o Fed já prevê o início de um novo ciclo de alta de juros, a Europa deve aumentar os estímulos nos próximos dias.
"Os países da Europa sofrem com um problema mais estrutural, causado pelo alto endividamento de países periféricos e pela rigidez no mercado de trabalho. Por isso, a tendência deflacionária é muito mais difícil de reverter", diz Nunes.
E, de acordo com Michael Klein, analista de economia internacional do instituto Brookings, nos EUA, a atuação dos BCs pode não ser suficiente para contornar os problemas. "É preciso haver uma combinação de fatores. A austeridade fiscal, por exemplo, pode prejudicar a economia e contribuir para pressões deflacionárias. Portanto, os BCs ajudam, mas não fazem tudo sozinhos."
'BOA DEFLAÇÃO'
Em meio à discussão sobre os malefícios da deflação, a Suíça se destaca como exceção. Com queda nos preços nos últimos quatro anos, registra, também, crescimento econômico e baixo desemprego. O caso leva alguns economistas a defenderem a existência da chamada "boa deflação". Mas, para Klein e Nunes, não é o caso.
"O que existe na Suíça é uma queda transitória de preços, causada pela moeda muito apreciada e a redução das commodities. Não é que haja excedente de oferta ou que os consumidores estejam com medo de consumir", afirma o professor da FGV.
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