Com inflação em baixa, queda na renda desacelera a partir do 3º tri
O terceiro trimestre deste ano trouxe uma virada na tendência de aceleração na queda da renda do trabalho no país. A diminuição acentuada dos rendimentos registrada nos primeiros seis meses do ano foi interrompida.
Do início da atual crise até agora, o trimestre que acabou em junho marcou o fundo do poço, quando a renda do trabalho caiu 5,6% em termos reais (descontada a inflação), segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do IBGE.
Os trimestres encerrados em julho e agosto revelam quedas menores em relação aos mesmos trimestres de 2015: -4,8% e -3,7%, respectivamente (ver gráfico abaixo).
"A melhora das expectativas de mercado nos últimos meses demorou a aparecer na área social, mas isso ocorre agora", afirma Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getúlio Vargas) no Rio.
"A crise ainda acontece e as pessoas seguem perdendo, mas o ponto mais crítico pode ter ficado para trás. A dúvida é se a recuperação será em forma de U ou W", diz, referindo-se à possibilidade de a perda de intensidade na queda da renda não se sustentar e voltar a acelerar nos próximos meses. "Mas julho e agosto são consistentes com a idéia de que a força da crise diminuiu."
A perda de velocidade na queda dos rendimentos do trabalho e sua eventual preservação são importantes, pois têm impacto direto sobre a capacidade de consumo das famílias e as chances de uma recuperação econômica mais vigorosa no futuro.
Os dados da PNAD mostram ainda quem mais perdeu renda na atual crise e o forte impacto da inflação sobre os rendimentos: quase 75% da queda no poder de compra dos brasileiros se deu pela alta dos preços; o restante, pela perda de ocupação.
A partir de agosto, no entanto, o desemprego passou a ser preponderante para a diminuição da renda real em comparação à inflação, que está em queda, o que ajuda a mater o poder aquisitivo.
"Até julho, a renda das pessoas caía muito mais por causa da inflação, o que favoreceu o ajuste macroeconômico pelo qual estamos passando", afirma Neri. Agora, o efeito do desemprego sobre a renda tende a ser maior.
Por segmento, sofreram as maiores perdas de rendimento as pessoas com menos anos de estudo, os jovens, chefes de família e moradores das periferias metropolitanas. Os que menos perderam foram as mulheres e moradores das capitais.
PERDAS MENORES
Para o economista Naercio Menezes, do Insper, uma das características da atual recessão é que, apesar de ter se instalado rápida e intensamente, ela não produziu estrago tão grande na renda do trabalho como outras crises.
"Na desaceleração entre 1996 e 2003, houve queda de 16% na renda do trabalho. Comparado a isso, a atual recessão até que poderia ser considerada mole", afirma.
Menezes suspeita que a regra atual de correção do salário mínimo, com reposição da inflação mais a variação do PIB de dois anos antes, e a onda de formalização do mercado de trabalho até a crise tenham protegido a renda dos brasileiros.
Gabriel Ulyssea, especialista em economia do trabalho da PUC-Rio, diz que "ainda é cedo" para conclusões sobre a tendência da renda.
"A inflação perdeu força. Isso ajuda a preservar os rendimentos, mas o desemprego tende a continuar subindo, limitando o consumo das famílias e a recuperação."
Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, a tendência do mercado de trabalho é "continuar um bom tempo no terreno negativo".
"Junho, julho e agosto têm cara de que deu uma melhorada, mas a renda segue caindo e o desemprego, subindo."
Em um cenário que inclui estagnação do crédito em 2016, diz, o caminho para a recuperação segue limitado.
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