RÉPLICA
Corte de gasto ameaça retomada da economia
Alan Marques/Folhapress | ||
Nelson Barbosa (esq.), então Ministro da Fazenda, e Valdir Simão, do Planejamento, falam sobre corte no Orçamento, em 2016 |
Em sua coluna na Folha no dia 12, Alexandre Schwartsman criticou minha posição contra o corte de despesas anunciado pelo governo.
Com a virulência que caracteriza suas arengas semanais, o colunista defendeu a redução adicional do Orçamento de 2017 argumentando que, como tal medida não reduziria o valor real das despesas, não haveria contração fiscal. O colunista se esqueceu de mencionar que o correto é analisar o gasto público em relação ao tamanho da economia, não em termos reais.
O corte anunciado pelo governo reduzirá a despesa primária federal de 19,8% do PIB, em 2016, para 19,2% do PIB, em 2017. Como a projeção oficial de crescimento é de só 0,5% para este ano, um corte dessa magnitude ameaça a recuperação da economia.
Segundo Schwartsman, os eventuais efeitos contracionistas do corte de R$ 42 bilhões serão mais do que compensados por seu impacto indireto -uma redução adicional da taxa de juro e um aumento da confiança.
Como qualquer hipótese, essa proposição pode ou não se verificar na prática. As evidências não são favoráveis à opinião do colunista.
A maioria dos casos analisados na literatura revela que contrações fiscais reduzem o nível de atividade no curto prazo. Somente onde a economia já estava crescendo antes do ajuste ou onde houve aumento exógeno de demanda -como uma expansão de exportações após uma depreciação cambial- a contração fiscal foi acompanhada pelo crescimento da renda.
Essas condições não se aplicam ao Brasil de hoje. Caso implementado, o corte de despesas anunciado pelo governo adiará a recuperação da renda e do emprego.
Vale lembrar, como fez Schwartsman, que o governo Dilma Rousseff adotou um forte ajuste fiscal no início de 2015, mas o colunista esqueceu que o governo corretamente revisou tal posição ainda em julho daquele ano, diante da evolução da economia.
Essa mudança foi com-
pletada no início de 2016, com a apresentação de medidas que permitissem mais gradualismo fiscal no curto prazo em troca de reformas estruturais que aumentassem o controle sobre gasto público no longo prazo.
Apesar da retórica política dos últimos meses, essa proposta foi ampliada após o golpe parlamentar do ano passado, com anúncio de um Orçamento com deficit, não só para 2016 mas também para os anos seguintes.
O governo Dilma também propôs a adoção de um teto para os gastos públicos, mas de modo diferente do que acabou aprovado em 2016. A ideia original era estabelecer um limite, em proporção do PIB, com prazo de quatro anos, a ser fixado no primeiro ano de cada mandato presidencial, e com possibilidade de revisão em períodos de baixo crescimento, como já ocorre para alguns limites de Estados e municípios.
O que foi aprovado estabelece o congelamento das despesas em termos reais, pelo prazo de 10 a 20 anos, tirando dos representantes eleitos pela sociedade o direito de decidir o tamanho do Orçamento em tal período.
Voltando à diatribe de Schwartsman, não sei se o colunista comete pós-verdades por ignorância ou má-fé. Bastaria uma busca na internet para saber minha posição sobre a reforma da Previdência: sou favorável a tal medida e a defendi durante o governo Dilma. Continuo com a mesma posição e sei que isso dificulta a caricatura que Schwartsman quer construir sobre minha pessoa. Ainda assim espero que ele continue lendo tudo que escrevo.
NELSON BARBOSA, doutor em economia pela New School for Social Research,
é professor titular da FGV e professor Visitante da UnB. Foi ministro da Fazenda
e do Planejamento (governo Dilma).
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