ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
DE SÃO PAULO

"Entender aos 15 anos que meu tempo valia dinheiro e que, se eu fizesse algo com valor para outra pessoa, ela me pagaria por isso mudou a minha vida", diz a designer Fernanda Colaço, 27.

Ex-participante do programa Junior Achievement (JA), fundado em 1919 pelos presidentes das empresas americanas AT&T, Strathmore Paper e um senador de Massachusetts, ela sustentou a família por cinco anos com um produto que desenvolveu no curso é hoje um dos 15 mil voluntários na mentoria de outros alunos.

Suas duas experiências foram em escolas particulares, mas ela acredita que o impacto seja ainda maior nas públicas —80% das atendidas.

Aprendendo a fazer
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"O programa te mostra que você é capaz de se sustentar, de produzir algo que tem valor, começando do zero."

Outra vantagem, dizem Fernanda e outros ex-participantes, é que os jovens aprendem a fazer uma empresa na prática, com toda a burocracia -pagar tributos, organizar a administração —e os conflitos envolvidos -discussões entre sócios e erros cometidos.

"Investimos R$ 300 em rolos de fita para enrolar nas alças dos chinelos, mas eles deram errado loucamente. Com as notas fiscais, conseguimos trocar por cola", conta ela.

Segundo Fernanda, o trabalho do voluntario é fundamental nessas horas, porque os alunos não têm experiência em tomar decisões, ainda menos as que afetam o retorno de seus investimentos.

ARRISCAR, ERRAR, SEGUIR

Das três miniempresas que ficaram entre as 20 finalistas do torneio latino-americano, duas eram de alunos de escolas públicas: a Coloke, de Blumenau (SC), que desenvolveu uma caixa com produtos relaxantes para pessoas ansiosas, e a carioca Line Up, que fez roupas de baixo com bolsos internos para levar dinheiro e celular na balada.

"Os jovens se transformam ao participar do programa", diz o presidente do Conselho Consultivo da entidade, o empresário Jorge Gerdau Johannpeter. "Acima de tudo, aprendem a arriscar, a errar e a ter coragem de fazer."

Para o empresário, que trouxe a entidade para o Brasil em 1983, ações como a JA "criam um um capital social importante para o país", que não têm histórico de educação empreendedora.

TEMPOS DE LAVA JATO

Numa época em que várias empresa foram envolvidas em acusações de corrupção, a entidade decidiu incluir um módulo de ética em seus cursos, diz seu presidente, Marcelo Carvalho, 50.

Durante cinco horas, os alunos participam de um jogo no qual passam por armadilhas e pegadinhas, de comprar CDs piratas a entregar um colega de trabalho que errou, e vão discutindo cada situação. "Foi uma oportunidade única de tratar esse tema, de forma aberta."

Para Carvalho, o ensino de empreendedorismo deveria ser política pública. Em 2017, os cursos da entidade chegaram a 13.479 estudantes, em 230 escolas, 79 delas na cidade de São Paulo.

"Queremos dar um salto de patamar. O Brasil precisa dar empregabilidade para os jovens, faixa em que o desemprego é o mais alto." Segundo o IBGE, estão desocupados 27,3% dos jovens de 18 a 24 anos de idade.

Neste ano, a JA e o governo testaram o curso de empreendedorismo em 15 escolas técnicas federais.

Foi contratada avaliação de impacto, para medir os resultados dos participantes em comparação com estudantes de mesmas características que não passaram pelo curso. O resultado não tem data para ser divulgado.

Levantamento do Global Entrepeneurship Monitor para os anos de 2016 e 2017 mostra o Brasil em 57º lugar entre 65 países em ensino para o empreendedorismo durante os anos escolares.

Numa escala de 1 a 9, o país fica abaixo de 5 em 11 de 12 quesitos de estímulo ao empreendimento -só passa da média em dinâmica do mercado interno, com 5,8.

Em 2012, pesquisa Datafolha mostrou que 60% dos brasileiros gostariam de ser seus próprios patrões, mas 11% estavam no comando de seu próprio empreendimento. Segundo o GEM, 15% dos adultos brasileiros estão em processo de empreender ou abriram uma empresa há menos de 4 anos.

Não há fórmula mágica, porém, na avaliação de Gerdau. "O mundo dos negócios requer resiliência, perseverança, humildade e colaboração. Ingressar nesse universo sem essas características é um risco adicional para os jovens", diz ele.

O empresário diz que o sucesso relâmpago de alguns empreendedores pode levar à ideia equivocada de que o caminho não requer esforço e, sim, sorte. "Sem esforço e perseverança não existe sucesso duradouro."

Crédito: Ricardo Borges/Folhapress Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 07/12/2017; Retrato de Fernanda Pupe Colaço, que criou no colégio uma fábrica de havaianas recobertas de tecido colorido, em 2003, e com o sucesso do produto conseguiu sustentar sua família durante cinco anos.( Foto: Ricardo Borges/Folhapress)
Fernanda Colaço mostra algumas das sandálias que produziu –e sua mãe continua a fabricar

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