Como um negócio sai do voo de pato para o salto do unicórnio?

IGOR PIQUET
ESPECIAL PARA A FOLHA

O primeiro unicórnio brasileiro surgiu neste mês. Trata-se da 99, aplicativo de corridas de carro e táxi, que foi comprada pela chinesa Didi Chuxing por US$ 1 bilhão –a partir desse valor de mercado, as start-ups são chamadas de unicórnios.

O caso foi bastante celebrado pelos meios especializados. No entanto, a realidade da maioria das start-ups e outras pequenas empresas no Brasil é bem diferente. O voo costuma ser de pato -baixo e que não se sustenta por muito tempo -, e não de unicórnio, cujas lendas dizem que voa alto e rápido.

Crédito: Carla Romero/Folhapress Pesquisa Datafolha prefeitos 18jun2012
Frame da tela do aplicativo de corridas 99

Cerca de 60% das empresas encerram as atividades após cinco anos, segundo constatação da pesquisa Demografia das Empresas, divulgada no final de 2017 pelo IBGE. E não só isso: menos de 1% das organizações nacionais são de alto crescimento, ou seja, ampliam o faturamento ou o número de funcionários em ao menos 20% ao ano, por três anos seguidos.

Burocracia do governo, falta de cultura empreendedora e dificuldade de acesso à capital ajudam a explicar porque os empreendedores não conseguem voar tão alto.

Mas há outros motivos, os chamados mitos de gestão, que podem atrapalhar quem quer ter uma empresa longeva. São eles:

"Basta ter uma boa ideia". Algumas das maiores empresas do mundo não foram as primeiras a criar seus produtos, mesmo as mais inovadoras. Facebook e Google, por exemplo, não inventaram a rede social e o buscador de internet respectivamente, mas demonstraram capacidade de execução ao melhorar esses produtos e seus próprios modelos de negócio para chegar, com mais qualidade, a um número maior de pessoas. O que importa é fazer melhor e mais rápido do que a concorrência.

"Basta um bom produto." Esse mito se aplica a quem acha que encontrou o segredo do sucesso duradouro em uma boa receita (como alimentos e bebidas que se tornaram tendências). A realidade é dolorosa: as maiores marcas de bens de consumo do mundo não têm produtos excelentes. Elas têm, sim, uma boa gestão da marca e de processos, um gestor que forma profissionais bons e se previne contra riscos para continuar entregando um produto de qualidade.

"Basta ser diferente." Uma ideia de negócio que se diferencie é um ótimo começo, mas não o suficiente. Caso um negócio seja só diferente, ele corre dois riscos: perder o aspecto de novidade ou ser copiado por um concorrente maior. O que realmente faz uma empresa crescer (e continuar crescendo) é o diferencial competitivo sustentável. É uma organização fazer algo melhor do que as outras, de um jeito difícil de ser copiado pelos concorrentes.

Por último, ter foco é essencial. À medida que empresas crescem, muitas oportunidades aparecem. É nesse momento que a maioria dos negócios brasileiros passa a ter o comportamento de pato -que caminha, nada e voa, mas no fim das contas não faz nada disso muito bem.

É aquela velha história de fazer uma coisa nota 10, em vez de várias notas 6. Em suma, eis aí o pulo do gato –ou melhor, o salto do unicórnio.

IGOR PIQUET é diretor de Apoio a Empreendedores na Endeavor Brasil. Administrador pela Universidade de Pernambuco, fez MBA no Insper e estudou finanças na Wharton School, nos EUA

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