JULIO WIZIACK
FÁBIO FABRINI
DE BRASÍLIA

O uso político da Caixa fez o banco se tornar o maior na concessão de empréstimos, mas hoje a instituição paga um preço alto: virou alvo da Lava Jato, teve de afastar quatro executivos por irregularidades e, sem socorro do governo, terá de encolher para cumprir as regras internacionais de solidez financeira.

O presidente Gilberto Occhi (PP), que também está sob investigação por irregularidades, tentou primeiro obter dinheiro do Tesouro. Depois, do FGTS. Mas sofreu um revés, e a saída agora, segundo pessoas que acompanham as discussões, é vender parte da carteira de crédito e repassar menos dividendos à União. Com isso, seria possível levantar R$ 15 bilhões.

Braço da União na implementação de programas sociais, como o Minha Casa, Minha Vida, o Bolsa Família e o Fies, a Caixa foi loteada: das 12 vice-presidências, 8 foram indicações políticas.

Pego pela PF na Operação Cui Bono?, o então vice-presidente de Pessoa Jurídica (hoje chamada de Corporativa), Geddel Vieira Lima, é acusado de aprovar empréstimos em troca de propina ou para agradar a políticos.

Para liberar de R$ 5 bilhões a R$ 8 bilhões em financiamentos para empresas, Geddel recebeu ao menos R$ 20 milhões em propina, segundo o delator Lúcio Funaro, operador do esquema no banco.

EXPANSÃO

A Caixa cresceu bastante durante os dois mandatos de Lula. Quando ele assumiu o governo, em 2003, tinha R$ 18,8 bilhões na carteira de crédito. Em 2011, na chegada de Dilma ao poder, esse estoque já era de R$ 212,7 bilhões.

A ex-presidente acelerou a política expansionista ainda mais e usou o banco para forçar as demais instituições a baixar os juros. Esse movimento foi acompanhado por uma diversificação das atividades da Caixa, que passou a fazer consignado e até financiamento de veículos.

Auditores do TCU (Tribunal de Contas da União) consideram que até programas sociais foram lançados "sem muita consistência". Criado em 2014, o Minha Casa Melhor, por exemplo, gerou prejuízo de cerca de R$ 500 milhões no primeiro ano.

Em 2016, quando Dilma deixou o governo, a Caixa já estava à frente do Banco do Brasil, com R$ 661 bilhões na carteira de crédito. A receita bateu em R$ 22,4 bilhões, mas o lucro foi de R$ 4,1 bilhões, segundo levantamento da consultoria Austin Asis.

"A Caixa foi quase uma extensão do Orçamento federal, uma forma de gastar sem prestar contas e segurar a crise financeira pelo crédito", disse Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Asis.

Segundo ele, a Caixa viu seu capital minguar diante dos custos elevados da prestação de serviços e do pagamento de dividendos bilionários para que o governo cumprisse suas metas fiscais.

Desde 1995, quando FHC assumiu o cargo, até o fim de 2016, a Caixa pagou quase R$ 40 bilhões à União, em valores corrigidos pela inflação. Somente com Dilma, o banco remeteu ao controlador R$ 29 bilhões –72,5% do total. Nesse mesmo período, o lucro do banco caiu 20%.

Sob Dilma, a eficiência medida pela relação despesas/receita bateu em 71%. Hoje está em 59%. Os bancos privados têm índice abaixo de 50%, diz Santacreu.

Desse período, diversas operações ainda seguem sob investigação do TCU. Os auditores questionam desde manobras para aumento do lucro até distribuição de dividendos.

UMA CAIXA DE ESCÂNDALOS

Os principais casos em que o banco foi alvo de investigações:

2004
Presidente do banco e outros executivos foram denunciados por gestão fraudulenta e corrupção na renovação do contrato com a GTech, dona do sistema de loterias

2006
O caseiro Francenildo Costa contou que o então ministro da Fazenda Antonio Palocci recebia empresários numa mansão. Suspeito de ter sido subornado, teve o sigilo quebrado pela Caixa, o que levou a queda de Palocci

2007
Controladoria-Geral da União (CGU) exonerou um superintendente do banco por ter recebido dinheiro de uma quadrilha que operou pela construtora Gautama

2010
Compra de participação no PanAmericano, banco que pertencia ao apresentador Silvio Santos, foi questionada após intervenção do Banco Central por fraudes na instituição

2011
Suposta falha no sistema de informações do banco permitiu que uma corretora vendesse papéis da dívida pública de baixo ou nenhum valor por preços acima do mercado. Prejuízo foi de R$ 1 bilhão

2012
CGU investigou o banco por inflar seus resultados em cerca de R$ 400 milhões com o encerramento de contas inativas sem devido "respaldo legal"

2015
TCU constatou o uso indevido do banco no pagamento de benefícios sociais, uma das bases para o impeachment de Dilma Rousseff. Banco foi envolvido na Lava Jato pela primeira vez. Empresas do deputado André Vargas receberam 10% dos ganhos de uma agência de publicidade com a Caixa

2016
Vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias da Caixa, Fábio Cleto afirma à PF ter feito parte de esquema com o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, de cobrança de propinas de grandes empresas em FI-FGTS, fundo administrado pelo banco

2017
Operação da PF investiga esquema de pagamento de propinas pelo então vice de Pessoa Jurídica, Geddel Vieira Lima, de empresas interessadas em obter financiamentos da Caixa

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.